|
Ah, os problemas!
José Paulo Viana - Professor de Matemática na Escola Secundária de Vergílio Ferreira, autor da seção "Desafios" aos domingos no jornal Público |
Nasci e vivi em Angola até aos 17 anos. Naquele tempo, em
português, não havia livros de divulgação matemática. Que eu saiba, tinham sido
traduzidos apenas dois livros, Curiosidades
da Matemática (de Eugene Northrop) e O
Encanto da Matemática (de W. W. Sawyer), ambos na coleção Livros Pelicano,
da Editora Ulisseia, mas que estavam esgotados. Só os descobri mais tarde, em
alfarrabistas, quando vim estudar para Portugal. Por isso, daqueles problemas
que nos desafiam e que nos dão vontade de analisar e resolver, unicamente conhecíamos
os que faziam parte da tradição oral e iam passando de boca em boca.
Um dia, ao chegar a casa ao fim da tarde, o meu pai entregou-me
umas folhas datilografadas.
– Acho que vais gostar de ver isto, mas olha que tenho de as
devolver na 2ª feira.
Na primeira página eram propostos três problemas e nas
seguintes estavam as resoluções. Eram três problemas que me deixaram
maravilhado e que, posso dizê-lo, foram um marco na minha vida. Nunca mais os
esqueci. Consegui chegar à solução de dois deles. O terceiro era o mais difícil
e fui obrigado a ler o que lá estava. O que mais apreciei neles foi perceber a
inteligência de quem os tinha inventado (ainda hoje, ao ler certos problemas ou
ao ver a forma como se consegue resolvê-los, me maravilho e me admiro com a
riqueza do raciocínio humano).
Relembro que, naquela época, não havia computadores, nem
internet nem sequer tinham sido inventadas as fotocópias. Se queríamos reter
alguma informação, a solução era copiar tudo à mão para uma folha de papel e
guardá-la. Foi o que fiz com os enunciados, mas as resoluções eram demasiado
longas. De qualquer modo, ao mudar para Portugal, a folha deve ter ficado por
lá por África e nunca mais a encontrei. Felizmente, os problemas marcaram-me de
tal maneira que nunca mais os esqueci (embora não consiga refazer completamente
a resolução do terceiro, aquele que era mais difícil…).
O meu preferido era o segundo, A Batalha de Hastings, que venho partilhar convosco.
Num antigo documento, encontrou-se este
breve relato da batalha de Hastings:
Os
exércitos normando e saxão postaram-se frente a frente, formados em quadrado.
Os normandos estavam em inferioridade numérica pois tinham menos 512 soldados.
No entanto, bateram-se com tal valentia e coragem que conseguiram desbaratar e
pôr em fuga o inimigo. No final da terrível batalha, tinham morrido metade dos
saxões mas do lado dos normandos os mortos foram poucos. Curiosamente, foi
igual o número de sobreviventes em cada um dos lados.
Quantos soldados tinha
cada um dos exércitos e quantos morreram na batalha?
Leitor, quer tentar resolvê-lo?
Resposta à questão do
mês anterior. Ver Aqui problema Anterior
Talvez tenha ficado surpreendido depois de fazer os
cálculos: bastam apenas 23 horas para que Portugal inteiro fique a conhecer a
anedota.
Já agora, se o objetivo fosse que o mundo inteiro – sete mil
milhões de pessoas – se risse com aquela história, não eram precisas mais de 32
horas, ou seja, um dia e 8 horas. É assim o crescimento exponencial…
Artigo de Opinião"100 Problemas" por José Paulo Viana de janeiro de 2013. Título: "Como Tudo Começou (Comigo)"
"100 Problemas" por José Paulo Viana de dezembro de 2012. Título: "Um Cêntimo para os Pobres""100 Problemas" por José Paulo Viana de novembro de 2012. Título: "Se é difícil, comecemos pelo fácil"
"100 Problemas" por José Paulo Viana de outubro de 2012. Título: "Quando as mentiras são o Problema"