Ana Galvão - A minha matéria preferida de sempre foi a trigonometria

Clube Entrevista

 

 
 

Ana Galvão nasceu em Espanha mas aos 14 anos mudou-se de forma definitiva para Portugal. Adorava matemática, onde a trigonometria era o conteúdo que mais gostava de trabalhar. A rádio obriga-a a estar sempre sintonizada na Antena 3 onde desenvolve a sua profissão com dedicação e paixão. Aqui fica a entrevista...  

Nasceu em Espanha. Como nos pode “apresentar” a sua infância?
Uma infância típica dos anos 80 em Espanha. Tardes a ver Laranjito e Verão Azul, litradas de sumo de nome acabado em "ang", dramas de faca e alguidar com os meus irmãos pelo domínio do spektrum, jogos de basquetebol todos os fins-de-semana (desporto muito popular por lá) e horas na rua a brincar com os amigos até a nossa mãe nos chamar para o almoço ou jantar. Tendo em conta que fui a filha do meio, essa tão pouco afamada posição, até fui uma criança bastante feliz. 

Como era a criança Ana Galvão na escola primária com 10 anos?
Boa aluna, mas muito mal comportada. Nas notas, até tinha uma boa média, contudo havia sempre chamadas de atenção dizendo que falava demasiado. Por volta dos 10 anos, precisamente, fugi da escola um dia inteiro com uma amiga mas fomos apanhadas instantaneamente por uma vizinha que estranhou ver-nos "à solta" em horário escolar.  

A matemática na escola era sintonizada em que antena?
Numa das mais altas. Eu adorava matemática e não me saia mal. A minha matéria preferida de sempre foi a trigonometria. Cheguei até a ajudar os meus colegas. Os anos posteriores, 10º e 11º custaram-me mais. 

Um momento em que a aula de matemática tenha sido notícia de primeira página? 
Quando percebi que a aprendizagem de música, com a qual trabalho todos os dias, usa a matemática. E melhor ainda, quando entendi que a linguagem digital é também ela, uma combinação de números que definem um canal ligado ou desligado. Foi uma revelação perceber que aquela língua matemática definia a música que iríamos escutar.  

Aos 14 anos muda-se para Portugal. Como foi essa mudança?
Foi desoladora para uma criança em plena adolescência, crise de identidade, e tontices inerentes. Perdi amigos, a casa de sempre, referências e demorei a adaptar-me. Os meus primeiros anos escolares em Portugal, no Instituto Espanhol (escola de língua castelhana) foram caóticos. Apenas endireitei na escola portuguesa, três anos depois.   

Como foi aprender uma língua nova, o português ...
Não me era estranho, filha de português, passei cá a maior parte dos meus verões. Na altura falava o portunhol, o que tinha desculpa pois vinha só de turismo.  Quando vim definitivamente a passagem pelo Instituto Espanhol suavizou a mudança. O que me fez realmente esforçar-me e querer falar bem português, foi a vontade de me integrar num grupo de amigos portugueses, e claro, o meu primeiro namorado luso. Sofri um pouco, mas a idade deu-me agilidade. 

A matemática é uma linguagem universal. Lembra-se se sentiu muitas diferenças no estudo da matemática em espanhol ou português?
Não senti diferenças algumas. Cheguei até, a ter aulas em castelhano, na escola, e um explicador português, ao mesmo tempo. Os conceitos são os mesmos, as fórmulas e os nomes também, quase todos. Infelizmente as dificuldades também não passam com a mudança de idioma.  

Quando é que a Rádio e a Televisão deixaram de ser uma incógnita para ser uma solução profissional?
Quando tive que decidir se havia de ir para a  universidade, como todos os meus colegas de escola, ou continuar a frequentar a rádio (onde já ia todos os dias) e apostar num curso específico e profissional de comunicação radiofónica, adiando a vida académica. Tornou-se óbvio, especialmente perante os  meus pais, que essa escolha teria que dar frutos práticos.   

Como define um dia seu de trabalho?
É uma sequência demasiado rápida de tarefas para que eu me consiga lembrar delas ao fim do dia. Assim que amanhece começo logo a tratar de assuntos, meus, do Nuno (que necessita sempre de apoio pela imensidão de coisas que tem para fazer). A maior parte dos dias tenho algo para escrever, e a seguir tenho uma emissão de rádio. Quando chego a casa nem me recordo bem de como o dia começou, apenas olho para a agenda para saber o que terei de fazer nos dias seguintes.  

Antena 3 é... 
A entrada para o paraíso onde habitam pessoas que têm a sorte de viver do que realmente gostam de fazer. 

Quando chegar a altura de ensinar a tabuada ao pequeno Pedro, quem a vai ensinar a Ana ou o Nuno Markl?
Penso que serei eu, o Nuno é mais virado para as letras. Sinceramente, fascinam-me as matemáticas, e tenho pena de ter perdido o fio à meada. As somas estão sempre a aparecer nas conversas com o Pedro. Desde sempre que faço contas e mais contas com as matrículas dos carros, gosto de manter a agilidade mental, e isso dá azo a que já tenha tentado explicar a regra dos 9 ao Pedro. Ele apenas me acha uma louca lançadora de números sem sentido. 
 
A escola é fundamental no futuro de qualquer criança. O vosso filho Pedro terá uns pais atentos a uma aprendizagem de qualidade?
Espero muito que tenhamos a clareza de o conseguir. Perante a quase total ausência de cultura na realidade quotidiana, e a velocidade e inconsequente chegada de informação pela presente tecnologia, parece-me imperativo que a aprendizagem do Pedro, na escola, seja o mais rica e duradoura possível. Tenho a certeza que no crescimento de um ser-humano é vital o saber adquirido na escola. 

É casada com um dos melhores humoristas portugueses. Quando é preciso falar a sério a o problema tem uma solução que se resolve...
Resolve-se. Ele sabe, de facto, falar a sério, embora a maior parte das vezes consiga  diminuir tudo a uma realidade altamente satirizável. Para além disso ele tem a habilidade de se saber rir de si próprio, e dos seus pequenos defeitos, o que facilita muito qualquer mal-estar.  

O matemático Alfred Rényi disse um dia que “quando estou infeliz trabalho matemática para ficar feliz. Quando estou feliz, trabalho matemática para me manter feliz”.  A Ana Galvão para ser feliz...
Trabalho a minha mente para que ela consiga sempre viver no presente, saboreando coisa por coisa no exato momento em que acontece. Quando o consigo, costumo sentir-me feliz. 

Publicado/editado: 01/10/2013