Maria Augusta Ferreira Neves - Entrevista Clube SPM de junho de 2015

Clube Matemática da SPM - Clube Entrevista
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Clube SPM faz História com a Matemática - 50 Entrevistas

Entrevista Clube SPM a Maria Augusta Ferreira Neves - Professora de Matemática e autora de manuais de Matemática

(As opiniões expressas pelo entrevistador e pelos entrevistados na rubrica Clube Entrevista são de sua exclusiva responsabilidade e não podem ser interpretadas como constituindo a posição oficial da SPM sobre os assuntos em causa.)


  


Maria Augusta Ferreira Neves é a convidada clube spm de junho de 2015. Uma edição dos melhores momentos, que mais parece um manual escrito com muita paixão, que vão desde a infância, profissão, Porto Editora, o dia-a-dia e, claro a matemática. Para muitos, uma das melhores autoras de manuais de matemática resolve um somatório de perguntas/problemas como se fossem o mais belo exercício de matemática. Este é o momento zero da entrevista número 50 clube spm com origem aqui...


A sua infância foi um exercício que foi sendo resolvido…  
de facto, ainda hoje, recordo alguns episódios que me marcaram. Como qualquer criança, brincava, fazia muitas travessuras. Lembro-me que, quando terminei a 2ª classe, e começaram as férias grandes, pedi ao meu irmão, que então já estava na 4ª, para me emprestar o livro de Matemática da 3ª classe. O meu irmão, nessa altura, já o tinha perdido, não sabia dele. A minha tia Aurora que vivia connosco em casa, resolveu fazer-me uma surpresa. Foi a uma livraria no centro da vila e comprou o livro de Matemática da 3.ª classe. Eu fiquei radiante, feliz da vida! Quem não gostou da brincadeira foi o meu pai que logo me advertiu: “agora tens o livro e portanto acabaram as férias até estarem os problemas todos resolvidos…”  
Levei a sério a advertência, tive que aprender sozinha muitas coisas mas, antes do início das aulas, os problemas da 3.ª classe estavam todos resolvidos. Talvez tenha sido este o meu primeiro exercício resolvido. Depois, entusiasmada com o resultado, repeti a dose na 4ª classe… e, como “prémio” do meu esforço o que perdi depois, foi, muitas vezes, o tempo do recreio… enquanto os meus colegas brincavam nos intervalos eu era “requisitada” pelas professoras para dar uma opinião sobre a resolução de alguns problemas…  

O que editava aos 10 anos de idade na aula de matemática?   
Talvez a minha primeira edição tivesse ocorrido nessa altura. Mais uma vez o meu irmão, então com o apoio do seu professor de História, afirmavam que era impossível, porque, não tinha fim, arranjar combinações que pudessem acertar nos 13 resultados do totobola. Eu defendia o contrário, garantia que era possível e tentei prová-lo. Arranjei um caderno e comecei a fazer desdobramentos de resultados para lhes provar que sim, que era possível acertar em todos os resultados. Trabalhei horas e horas, durante vários dias e praticamente enchi um caderno com todos os desdobramentos possíveis até sete apostas, assim os convenci que tinha razão. Esta foi provavelmente a minha primeira edição…  

A paixão pela matemática teve o momento “zero” com que idade?   
A paixão pela matemática começou muito cedo, dava eu os primeiros passos na escola. Como descrevi na primeira resposta, com 8 anos, eu já queria resolver todos os problemas de Matemática que iria estudar no ano seguinte. Diria que o momento “zero”, foi anterior a este período, provavelmente por volta dos 6 anos, quando entrei para a escola e como o meu pai dizia que gostava de Matemática e não gostava de Francês, logo assumi que gostava de Matemática e não gostava de Francês.  

O seu primeiro manual de matemática que foi editado para o ensino esteve logo na moda. Porquê?  
Fui contactada pelo Doutor Vasco Teixeira para escrever manuais para a Porto Editora. A razão desse contacto estava no facto dos meus alunos tirarem muito bons resultados nos exames. Não foi fácil convencer-me a escrever o primeiro manual. Disse ao Doutor Vasco Teixeira que não sabia escrever manuais, apenas sabia dar aulas e tinha muito prazer nisso. Depois de muita insistência escrevi o meu primeiro manual quando tinha 27 anos. Terminado o período das adoções, fui chamada à Porto Editora, onde fui informada que tinha sido o manual mais adotado a nível nacional. Conhecia as razões das dificuldades que os alunos encontravam no estudo da matemática, os manuais que então editei procuravam, tal como hoje, dar resposta a esse problema. Olhe, sinceramente, acho que esse facto e a “pontinha” de sorte que é preciso também ter na vida, ajudaram a que estivessem desde logo na moda…  

Os seus livros de matemática são sólidos e influenciaram centenas de professores para ensinar melhor. A fórmula foi e é…  
desde logo uma enorme paixão pelo que se faz, depois a formação académica e o estudo que nunca se esgota e que se procura melhorar a cada momento, depois a humildade e, finalmente, a vontade de poder ajudar os nossos estudantes a melhorar o seu desempenho e a desenvolver o gosto pelo estudo da Matemática. Tudo isto, combinado, pode resumir-se a uma fórmula: procurar a cada momento fazer mais e melhor. 

   
  


Um dia atual da Maria Augusta é um somatório de…  
trabalho, muitas horas diárias a estudar, a produzir texto, escrevendo e reescrevendo, procurando encontrar novas abordagens, corrigindo provas. Quando digo muitas horas diárias, são mesmo diárias, incluindo sábados, domingos e feriados… claro, pelo meio surgem ações de formação para professores um pouco por todo o país. Sobra evidentemente, algum espaço para conviver com a família e com os amigos. Raramente, também arranjo algum espaço para viajar. Não me queixo, faço aquilo que gosto e estou sempre pronta para acolher novas experiências profissionais.  

Esteve sempre ligada à mesma editora. Nunca foi tentada a mudar este lugar geométrico?  
Nasci ali, cresci naquele ambiente familiar e o modo como sempre fui acarinhada e incentivada fizeram dela a minha segunda casa, o espaço onde me sinto apoiada e respeitada. Não há tentação que ultrapasse esta paixão! 

   
  


Usando como variável todos seus livros editados, a frequência absoluta é…  
pelo menos de  dezenas e, com certeza, que a frequência absoluta vai aumentar.  

Isaac Newton referiu que “construímos muros demais e pontes de menos”. Um algoritmo simples para melhorar o nosso ensino tornando-o menos agudo seria…  
a sociedade e o governo terem em conta que a Matemática e as línguas são fundamentais para abrir portas ao sucesso social e económico do país, melhorar as condições de trabalho dos professores e, em paralelo, no caso da Matemática sensibilizar os pais e os alunos para a necessidade de desde cedo utilizarem mais tempo, mais papel e mais borracha no estudo desta disciplina.  Este seria o algoritmo para melhorar o sucesso no nosso ensino.  

O desdobramento à disciplina seria fundamental para termos mais sucesso em Portugal?  
Não estou certa disso. O insucesso em Matemática tem causas muito diversas, desde a indisciplina, falta de empenho e trabalho individual dos alunos, programas extensos, professores ocupados com burocracias, alunos com carga horária exagerada no global e insuficiente na Matemática, …  

O domínio é a matemática, o conjunto de chegada a população portuguesa, o contradomínio é…  
dividido em dois subconjuntos; um deles é formado por aqueles que com a ajuda da Matemática desenvolveram capacidades que transferiram para outras aprendizagens e encontraram profissões onde se realizam; o outro subconjunto é formado por aqueles a quem a Matemática travou a concretização dos seus sonhos. Gostava que todos nos envolvêssemos para que este último subconjunto fosse o conjunto vazio. 

   
  


O matemático húngaro Alfred Rényi disse que "quando estou infeliz trabalho matemática para ficar feliz. Quando estou feliz, trabalho matemática para me manter feliz". O que a faz feliz para além da matemática?  
Para além da Matemática o que me faz feliz é ver felicidade à minha volta. Gostava que todas as pessoas fossem pelo menos tão felizes quanto eu.


Entrevista por Carlos Marinho
 
Publicado/editado: 01/06/2015