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Este
espaço vai ser dedicado a aspectos simples da vida em contexto real, em
que a matemática pode entrar como elemento surpresa. Em síntese, estas
"linhas" terão como base "pontos" comuns da nossa vida, em que a
objectividade da Matemática pode fazer compreender alguns "problemas"
que vão surgindo em contexto real. Como afirmou Pitágoras, "Todas as
coisas são números". Nesta rubrica tudo cabe... até a matemática.
Carlos M. Marinho -
Coordenador do Clube da Matemática da Sociedade Portuguesa de Matemática
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O Matemático enquanto profissional tem na sua actividade ferramentas que lhe permitem responder mais rapidamente aos problemas que trabalha. Um desses exemplos é a máquina de calcular. Wilhelm Schickard (1592-1635) construiu a primeira máquina de verdade. Esta fazia multiplicação e divisão, mas foi perdida durante a Guerra dos Trinta Anos, sem que seu inventor pudesse defender sua primazia. Mas o matemático usa a máquina de calcular? Claro que sim.
Como o carpinteiro usa o martelo ou o serrote. Não estamos a ver o carpinteiro depois de criar (pensar) numa estrutura/móvel quando chega à fase de juntar as peças andar a martelar pregos com as mãos ou com a cabeça.
Suponhamos que um determinado exercício é construir uma cadeira. O carpinteiro tem de pensar a cadeira. Desenhá-la no papel. O martelo ou serrote são necessários nesta fase? Não.
A seguir, escolhe a melhor madeira. Tira medidas.
Tira medidas com o serrote ou com o martelo? Não.
Então quando utiliza estas famosas ferramentas? Na altura certa, elas vão ter uma utilidade fundamental. O mesmo acontece na matemática.
A máquina de calcular é uma ferramenta fundamental para quem faz matemática, em particular que pode ser usada pelas nossas crianças/adolescentes que depois de “pensarem” na resolução de um exercício precisam de obter cálculos “complexos” para chegarem ao resultado final. Num exercício de 10 minutos, esta ferramenta é necessária utilizar (deve ser usada) durante breves segundos.Tem de ser usada com aquele "quantum satis" que deve existir em todas as coisas.
O mais pernicioso e perigoso é uma criança que num determinado estádio de desenvolvimento, por exemplo, na resolução de um sistema de equações, coloca os dados na máquina e, obtém o par ordenado solução. Sem esforço, a não ser carregar em meia dúzia de teclas, determina a solução. É a mesma coisa que o carpinteiro chegar aos seus clientes com uma foto de uma cadeira e, dizer aqui está a vossa cadeira! Não serve para nada, pois não!
Ou se quiserem um outro exemplo, imaginem que estão a ler um livro e, em vez de percorrerem as emoções e as histórias narradas vão directamente para o seu final.
O contributo e a riqueza da matemática é “obrigar” o aluno a estar 10 longos minutos a resolver o sistema de equações, utilizando por breves segundos a máquina de calcular. Gostaria de pensar que estará em proporção como se utiliza o martelo na realização de uma cadeira.
Isto não seria um artigo decente se não vos obrigasse a utilizar a máquina de calcular com o seguinte exercício:
Vá lá, peguem nas vossas máquinas de calcular. Corram. Mexam-se. Têm vinte segundos. O primeiro que conseguir tem o prémio psicológico de poder afirmar: Eu fiz primeiro, dentro do tempo previsto. Que chatice, as máquinas nunca estão quando é preciso. Já está? Então aí vai!
Qual é maior? 37% de 78 ou 78% de 37?
Que conclusão chegou? Desiludido! Não!
A verdade é que, em geral, o mais importante é a ideia mais do que uma conta. Luís Caffarelli, considerado um dos melhores matemáticos argentinos de sempre afirmou que “nós matemáticos construímos raciocínios, não números”. Atacar um problema recorrendo à força bruta nem sempre é aconselhável. Do que se trata aqui é resolver o problema sem fazer contas.
Este é um exercício que Adrián Paenza nos coloca e, que a ideia passa em chamar a atenção que é preciso multiplicar 37 por 78 e, depois dividir por 100. Por outro lado, obter 78% de 37 passa simplesmente multiplicar 78 por 37 e, dividir por 100. Afinal, a multiplicação é comutativa. A ordem dos factores não altera o produto. Seja qual for o resultado (que afinal é 28,86), o que se conclui é que em ambos os casos estamos a falar do mesmo resultado. Isto é, matemática. Competência? Definitivamente.
Mas afinal, em que ficamos? Como disse Descartes, “o bom senso é a melhor coisa partilhada no mundo”, logo a máquina é um instrumento que deve ser usado para fazer matemática em alguns momentos (escassos), que se apresenta como uma peça importante num puzzle, mas nunca será a mais importante, essa será sempre o pensamento, a ideia.
P.S. - Há dias dei uma entrevista na Rádio M80, com o competente José Araújo que me fez uma pergunta pertinente: o que deve fazer um pai ou mãe quando percebe que o seu filho diz que não gosta de matemática?
Este poderá ser o assunto de um próximo artigo. Por agora, vou pensar no artigo e, na resposta que dei ao José Araújo e aos ouvintes da M80 (só pode ser uma boa rádio, M de Matemática e 80 continua a ser um bom número, é par, tem 2 divisores primos (o 2 e o 5) e, me faz lembrar os belos anos oitenta).
Cumprimentos Matemáticos