(U)Ma Temática Elementar por José C. Santos

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião fevereiro de 2016

 


A Matemática elementar tem muito que se lhe diga. Embora nos seja familiar, é sempre possível encará-la de um ponto de vista novo ou inesperado.                                    

José Carlos Santos - Departamento de Matemática da FCUP                           


Dia 21 de cada mês

                 


(U)Ma Temática Elementar por José Carlos Santos - Primos de Mersenne

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Título: Primos de Mersenne

Os números perfeitos (ou seja, números que são iguais à soma de todos os seus divisores, com excepção do próprio número) já foram mencionados nesta rubrica. Foi aí dito que:


 Euclides provou que se p for um número natural tal que 2p – 1 seja primo, então 2p-1×(2p – 1) é um número perfeito;


 no século XVII, Fermat provou que se 2p – 1 for primo, então p é primo;


 no século seguinte, Euler provou que qualquer número perfeito par pode ser obtido pelo processo descrito por Euclides.


Sendo assim, para se encontrarem números perfeitos pares, procede-se do seguinte modo:


1. Toma-se um número primo p.


2. Verifica-se se 2p – 1 é ou não primo.


3. Se for, então 2p-1 ×(2p – 1) é um número perfeito.


Os números primos da forma 2p – 1 são os chamados primos de Mersenne, que já foram estudados por Marin Mersenne, um contemporâneo de Fermat que se correspondia com ele.


Como é que se pode ver se um número da forma 2p – 1 é ou não primo? Como já foi mencionado, se p não for primo, então 2p – 1 não é primo. E se p for primo? Constata-se facilmente que 22 – 1 (= 3), 23 – 1 (= 7), 25 – 1 (= 31) e 27 – 1 (= 127) são todos primos. E 211 – 1, ou seja, 2.047? É primo ou não? Podemos começar a ver se tem divisores menores que ele próprio (e maiores do que 1), mas Fermat encontrou uma maneira de fazer isto que poupa muito trabalho. Ele provou que, se p é primo e diferente de 2, então todos os seus factores primos são da forma 2×p×n + 1, para algum número natural n. Sendo assim, para encontrarmos eventuais factores primos de 211 – 1, basta testar os números primos da forma 22×n + 1. O primeiro destes números é 23 e é fácil ver que 211 – 1 = 23×89. Em particular, 211– 1 não é um primo de Mersenne.


E quanto a 213 – 1 (= 8.191)? Pela mesma ideia, para ver se é um primo de Mersenne basta ver se é ou não múltiplo de algum número primo da forma 26×n + 1. Ora 26 + 1 = 27, que não é primo. Em seguida temos 2×26 + 1 = 53, que é primo, mas que não divide 8.191. Depois temos 3×26 + 1 = 79 e, mais uma vez, é um número primo que não divide 8.191. O número a considerar a seguir é 4×26 + 1 = 105, que é composto. Em seguida vem 5×26 + 1 = 131, mas agora podemos parar. Com efeito, qualquer número composto tem um divisor menor ou igual à sua raiz quadrada e a raiz quadrada de 8.191 (= 213 – 1) é menor do que a raiz quadrada de 214, ou seja, é menor do que 27 (= 128). Visto que já ultrapassamos este valor sem ter encontrado nenhum factor primo, concluímos que 213 – 1 é primo e, portanto, que é um primo de Mersenne.


Acontece que os números primos p tais que 2p – 1 também é primo são bastante escassos. Embora, caso p < 20, 2p – 1 só seja composto quando p = 11, constata-se que, dos trinta e oito primos p que há com 20 < p < 200, só em cinco deles (31, 61, 89, 107 e 127) é que 2p – 1 também é primo.


Foi dito, no texto desta rubrica relativo a números perfeitos, que só se conhecem 48 primos de Mersenne e, consequentemente, que só se conhecem 48 números perfeitos. Esta afirmação estava correcta na altura, mas já não está. Em Janeiro deste ano foi descoberto o 49º primo de Mersenne, que é 274.207.281 – 1. Já agora, este número é o maior número primo conhecido e, para o escrever em base 10, seriam precisos 22.338.618 algarismos. De facto, os dez maiores números primos conhecidos são primos de Mersenne e desde 1992 que de cada vez que o recorde de maior número primo conhecido é batido, o recordista é um primo de Mersenne.


Um problema em aberto é o seguinte: há ou não uma infinidade de primos de Mersenne? Visto que se desconhece a resposta a esta pergunta, também não se sabe se há ou não uma infinidade de números perfeitos.


Publicado/editado: 21/02/2016