Título: O Cavaleiro da Triste Eleição
Episódio I por Gonçalo F. Gouveia - Dia 1
O sargento Reis, veterano da Guarda, sentiu que lhe ardiam novamente os olhos e voltou apassar o lenço pela testa, mais por entretenimento que por eficácia, porque o calor era tal que sentia que toda o seu orbe calvo se liquefazia. Suspirou pela centésima vez e amaldiçoou quem tivera a ideia de os por numa operação de fiscalização a viaturas numa estrada onde a única viatura era a deles. Dele e do malandro do Cabo Ferreira que se ausentara para ‘verter águas’ e ainda não voltara. Foi ao abanar desolado a cabeça que o viu pela primeira vez: na curva, bem ao meio da estrada, perfilava-se uma visão extraordinária: no lombo de uma pileca miserável cavalgava um sujeito carregando uma longa vara à guisa de lança, coberto por uma armadura improvisada em cartão canelado; na cabeça, brilhando ao sol, empoleirava-se uma arrastadeira ostentando uma etiqueta onde se lia: ‘Propriedade do Centro de Saúde’. O Sargento, atónito,reconheceu finalmente o Presidente da Junta da vizinha Carcamelos quando o estrambólico personagem berrou a plenos pulmões: ‘Prostrem-se hostes, que se vos apresenta D. Quixote, o da Triste Eleição, que vencido em justo escrutrinio, caminha para o exílio!’.
Episódio II por José Carlos Pereira - Dia 6
Ao ouvir aquilo, o Sargento não evitou falar para os seus botões “este homem pirou!” e acto contínuo manda-o parar e ordena-lhe:
− Ó homem desça do cavalo que ainda se aleija! Pior, ainda aleija o animal!
O Presidente, ajeitando a “armadura” e o “capacete”, responde ao Sargento:
− Não vê que tenho de fugir para o exílio? Deixe-me seguir!
Entretanto, o Ferreira, ainda com as calças na mão, chega perto do seu superior e ao ver toda aquela cena não conseguir evitar rir descontroladamente ao mesmo tempo que diz, alto e bom som, “o presidente endoideceu, está maluco!”. A situação descontrolou-se rapidamente. O Sargento não conseguia impor a sua autoridade e a forma incontrolável como o Cabo Ferreira ria também não ajudava nada. Mas algo pior vinha a caminho.
Ao fundo, algumas dezenas de pessoas corriam pela estrada empunhando enxadas, foices e outros instrumentos agrícolas, gritando “não o deixe fugir Sargento, esse sacana tem muito que explicar”. O presidente ao ver aquela gente toda atrás dele espeta as esporas na pileca que arranca a toda a velocidade.
O Sargento não sabe o que fazer, pergunta o que se está a passar mas só lhe respondem “temos de o apanhar esse miserável, o sacana tem muito que explicar”.
Episódio III por José Carlos Santos - Dia 11
Falar é fácil, mas o facto é que enquanto aquela gente ia toda a pé, o Presidente ia a cavalo… se é que se podia chamar isso àquele pobre animal. Mas sempre se deslocava mais depressa que toda aquela multidão.
O Sargento ainda estava longe de perceber o que tudo aquilo queria dizer, mas finalmente soube o que fazer. Virou-se para o Ferreira e disse:
— Ferreira, controle-me aqui essa gente que eu vou de carro e apanho o Presidente. Agora se consigo fazer com que ele me ligue… Bom, isso já não sei dizer.
O Ferreira ficou atarantado, mas o Sargento nem lhe deu tempo de falar. Meteu-se no carro e seguiu atrás do Presidente. A multidão entretanto chegou junto do Cabo e este finalmente tomou uma atitude.
— Alto! — disse ele para as pessoas. — Podem dizer-me o que vem a ser isto?
Um homem já de uma certa idade mas com ar rijo e de autoridade perguntou:
— Então não sabe o que foi que este malandro fez enquanto foi Presidente da Junta?
Episódio IV por José Veiga de Faria - Dia 16
Episódio IV por Sílvio Gama - Dia 21
Episódio VI por Carlos Marinho - Dia 26
FIM