Entrevistado do mês de Junho - O Humorista Óscar Branco

Entrevista a Óscar Branco - Humorista

       

O que nos pode “contar” da sua infância?

A imagem que tenho mais nítida é que era mais novo, se calhar até mais novo do que sou agora. Tive a infância possível num pais ainda rural, agravada pelo facto de a ter vivido numa vila escondida de Trás os Montes, Montalegre, com o padre Zé a comandar o rebanho com rédea curta. Eram tempos ainda medievais com um ou outro, muito poucos, a espreitar o Renascimento.  Filho de funcionários públicos tive o direito de ir à escola em vez de andar a cavar batatas e, claro, ter lugar assegurado na procissão das festas do Senhor da Piedade. Sempre enfiado na turba no monte  dos anjinhos, só uma vez apanhei o lugar de Menino Jesus porque o “Nando” estava com sarampo.


Gostava de matemática na escola?

Era um barra…barra pesada, digo eu. Os rapazes amontoados da 1ª à 4ª classe na mesma sala e as raparigas noutra como convém à moral. Via os outros levarem com a “Sta. Luzia”, uma palmatória toda trabalhada em madeira com tremidos e entalhes, uma autêntica obra de arte e então a aritmética fluía maravilhosamente. Nunca percebi se era bom aluno por medo ou vocação. Eu e a matemática, vivemos em serena união de facto durante uns anos, até que, já no Porto, fui internado com “garrotilho” no hospital “Goelas de Pau”. Voltei e os outros tinham dado a raiz quadrada na minha ausência, senti-me traído e a paixão esfriou. O inevitável divórcio aconteceu em engenharia, tive um caso sério com o teatro e troquei o Cálculo Diferencial e Integral do Piskounov pelo calculismo de “Macbeth” e a obra integral de Moliere. 


Em criança já fazia umas piadas na aula de matemática?

Muitas e era sempre premiado. Cada piada, cada puxão de orelhas e em dias especiais um cachaço aplicado com a imensa sabedoria do sr. professor. A matemática marcou-me muito, principalmente nas orelhas.


Lembra-se como e quando “equacionou” ser humorista?

Não chegou ao nível da equação, o problema resolveu-se com uma regra de três simples.


O Óscar Branco é um “caso notável” no humor. Qual é o seu segredo?

Aparentemente, o segredo deixa de o ser quando o caso é notável. Apesar de ser um dos pioneiros do novo humor português, nos longínquos anos 80, o facto de viver num pais macrocéfalo empurrou-me para a regionalização. A renovação do humor foi fruto do esforço de indíviduos e não de uma geração como o caso notável de Herman José, por exemplo. Eu fiz a minha parte mas estava a 300Km de distância e tive de esperar muitos na zona dos Carvalhos à espera que acabassem a auto estrada.


Na matemática “inventam-se” fórmulas para tudo. E no humor?

A dificuldade do humor é não ser uma ciência exacta. Se um humorista arrisca fugir da zona de conforto das anedotas não tem fórmulas exactas, apenas experiências que muitas vezes nos explodem na cara.


Como vê o humor e a nova geração de humoristas em Portugal?

Ignorado pelos críticos e especialistas, o programa “Levanta-te e Ri” foi o grande tiro de partida para a mudança do humor em Portugal, abrindo caminho a nomes como Ricardo Araújo Pereira, Nilton, Bruno Nogueira e muitos outros. Orgulho-me de ter sido o único humorista veterano que o integrou desde o seu início. Há uma nova geração interessada no humor mas é exagerado falar em nova geração de humoristas. O humor em Portugal ainda vive na imaturidade do fascínio pelo que se faz lá “fora” e por vezes cai-se na armadilha da colagem ou mesmo do plágio. No meio de muitas coisas boas que vão surgindo, às vezes vejo sketches ou situações em que me pergunto: Onde é que já vi isto?… Apesar de tudo há uma evolução, pelo menos nos talk shows já põem, em fundo, uma imagem de Lisboa em vez de Nova Iorque.


O humorista é como o matemático, se arranja uma solução errada temos um problema.

Claro que temos sempre uma ou outra solução de recurso. Quando estamos perante um público e embatemos num muro de silêncio, convém sempre ter saídas de emergência para evitar o pânico.


O professor de matemática em Portugal tem de ter muito sentido de humor…

Convém. Os anti depressivos e ansioliticos são caríssimos.


A matemática não se casa porque tem muitos problemas. É uma boa piada matemática?

Perde a piada se não se encontrar a solução do problema.


Uma história engraçada (anedota/piada) com números…

Para que uma relação sexual funcione têm de se somar 2, elevarem-se à máxima potencia e multiplicarem-se por 4.


Portugal continua a ser um País onde se pode rir?

Enquanto o riso não for taxado temos por aí motivos de gargalhada. Olhamos à volta e vemos um pretenso jet set que é um autêntico gag com pernas, jovens actrizes com o chamado síndrome Ikea, isto é, para trepar na carreira aumentam as “prateleiras”, levam-se para casa e são fáceis de montar. Também há muitas anedotas políticas, o problema, como já alguém disse, é que as anedotas politicas às vezes são eleitas.


Quando nasceu foi logo galardoado com um (nome) “Óscar”…

Recebi um Óscar incompleto, ainda ando a tentar pintá-lo de dourado.


Existem muitas homenagens e prémios carreira neste País. Não acha que a sua carreira já merecia pelo menos um agradecimento especial…

Eu próprio me encarrego de me ir agradecendo. Na vida, quem conta pelos seus dedos, conta sempre pelo seguro.

Publicado/editado: 01/06/2011