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E a matemática pediu namoro à
poesia, mostrando-lhe todas as suas qualidades que passavam por sinais
aritméticos de riqueza, campos cheios de raízes quadradas e um coração
infinito, onde cabiam todos os números perfeitos, como convém a quem se
quer apaixonar. Ela, a poesia, achou-lhe graça. Encontrou-lhe alguma
métrica e deixou-se deslizar em hipérboles que sendo linguísticas a
levaram a exageros que nem o teorema de Pitágoras conseguira resolver.
As incógnitas desta relação eram muitas, atendendo às suas
personalidades ímpares, com números primos à mistura. Foram vivendo numa
matriz de entendimento construída por rimas pouco lógicas e amores em
fracções de denominador comum que sustentavam médias de paixão numa
POEMÁTICA difícil de teorizar…
Nuno
Guimarães - ex-engenheiro, leitor de Português nas Universidades de
Vilnius e de Vytautas Magnus (Kaunas), com manias de poeta…
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o professor de matemática
tinha sacos de algarismos em casa
que juntava desde pequeno
roubando-os das portas da vizinhança
e dos preços da frutaria da esquina
cuja menina
haveria de ser um dia
a sua eterna namorada
tinha-os das matrículas de automóveis
tinha-os dos prazos de validade
dos xaropes que tomava
tinha-os, surripiados, dos Km das estradas
estabelecendo a teoria das distâncias acabadas
o professor de matemática
vestia-se de algarismos coloridos
e tomava banhos em zeros subtraídos
que borbulhavam como sais
na sua banheira encarnada
tinha algarismos talhados
cortados
em fugas precipitadas
outros, já acamados
com idade avançada
lutavam por não morrer
nas estatísticas falhadas
o professor era estranho
no seu jaguar castanho
com matrícula apagada
usava gravata amarela
e um grande três na lapela
esse três, como dizia
a conta que Deus lhe fez
ao ensinar tabuada
o professor de matemática
era ele próprio, um número quase infinito
de histórias
de loucuras
de bravuras
de ternuras
de aulas cheias de aventuras
o professor existiu!
durante a construção do poema
Artigos de meses anteriores:
Artigo poemática de Fevereiro - "as operações do amor"
Artigo poemática de Janeiro - "Números em Catadupa"
Artigo poemática de Dezembro - "Uma progressão de Natal"
Artigo poemática de novembro - "Números de Outono"
Artigo poemática de outubro - "Teorema dos Amor dos Conjuntos Infinitos"
Artigo poemática de setembro - "As Contas Todas"