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José Carlos Santos - Departamento de Matemática da FCUP Dia 21 de cada mês
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π/4 = 1 – 1/3 + 1/5 – 1/7 + 1/9 – 1/11 + …
Esta é uma das muitas maneiras conhecidas de exprimir π (ou, o que vai dar ao mesmo neste caso, π/4) como uma soma com uma infinidade de parcelas. Também é possível exprimir π como um produto com uma infinidade de parcelas; uma tal expressão, da autoria de John Wallis, é mencionada no texto acima referido. Acontece que se pode deduzir da fórmula de Leibniz uma outra expressão para π/4, onde este número aparece como um produto:
π/4 = (3/4)×(5/4) ×(7/8) ×(11/12) ×(13/12) ×(17/16) ×…
Nesta fórmula, π/4 exprime-se como um produto com uma infinidade de parcelas, cada uma das quais é um número racional. É fácil perceber quais são os numeradores daqueles números racionais: são os números primos, excepto o 2; por outras palavras, são os primos ímpares. Quanto aos denominadores, são todos múltiplos de 4. Mais precisamente, para cada numerador, o denominador é o múltiplo de 4 que lhe está mais próximo.
É interessante ver como se comporta a sucessão
3/4, (3/4)×(5/4), (3/4)×(5/4) ×(7/8), …
Como foi afirmado, converge para π/4. Mas converge de uma maneira tortuosa. A sucessão nem é crescente, nem é decrescente nem os seus termos estão alternadamente acima e abaixo de π/4. De facto, os termos da sucessão têm muita mais tendência para estarem acima de π/4 do que para estarem abaixo. Com efeito, dos primeiros 10.000 termos da sucessão, menos de 1% está abaixo de π/4.
Por outro lado, embora se tenha feito referência acima a «produto com uma infinidade de parcelas» e a «sucessão», a demonstração de que π/4 se pode escrever como um produto da maneira acima indicada não depende de haver uma infinidade de números primos. Por outras palavras, a demonstração da igualdade continuaria válida mesmo que só houvesse uma quantidade finita de números primos. E isso leva a uma consequência divertida. Já se sabe, desde o século XVIII, que π é irracional. Mas então a igualdade
π/4 = (3/4)×(5/4) ×(7/8) ×(11/12) ×(13/12) ×(17/16) ×…
permite provar que há uma infinidade de números primos. Com efeito, se o conjunto dos números primos fosse finito, a igualdade anterior exprimiria π/4 como o produto de um número finito de números racionais e, portanto, π/4 seria racional. Visto que não o é, está provado (de uma maneira particularmente contorcida) que existe uma infinidade de números primos!