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Entrevista com Domingos Paciência - Treinador de Futebol


     


Domingos Paciência descobriu o futebol muito cedo, primeiro com ao amigos e, depois no centro de estágio do F. C. Porto aos 13 anos onde aprendeu e desenvolveu a paixão pelo futebol. Assinou o seu primeiro contrato de futebol com o clube azul e branco. Durante quatro longos anos, cresceu e viveu na academia longe da família, contudo foi uma experiência que o conduziu ao sucesso enquanto homem e jogador profissional de futebol. O início da carreira de futebol, enquanto profissional surgiu naturalmente aos 17 anos onde assinou o seu primeiro contrato como futebolista pelo F. C. Porto, um momento ímpar, por se tratar de uma momento que viria a modificar para sempre a sua vida e a carreira de futebolista.

A posição de ponta-de-lança foi sempre ao longo da sua carreira o espaço privilegiado onde se movimentava dentro do campo apesar de ter apenas 1,74. As características franzinas, rápidas, muito móveis no espaço da grande área adversária faziam com que os concorrentes tivessem muitas dificuldades na abordagem que fazia a cada jogada. 

Durante 10 longos anos fui titular indiscutível duma das melhores equipas portuguesas, da Europa e do Mundo, onde no ano de 1987 foi campeão do mundo contra o Penharol onde o treinador da equipa era Tomislav Ivic e, onde pontificavam os melhores jogadores dessa época. Durante 10 épocas, de 1987 a 1997, sempre como jogador do F. C. Porto marcando 97 golos em 232 jogos efectuados. No final da época de 96/97 decidiu jogar no estrangeiro, concretamente no Tenerife. Dois anos volvidos regressou de novo ao F. C. Porto onde marcou 9 golos em 31 jogos.

A primeira internacionalização pela selecção nacional portuguesa surgiu em 1988. Jogou até 1997 atingindo 35 internacionalizações. Terminou a carreira de futebolista de alta competição no clube que viu nascer na época de 2000/2001, onde de imediato teve um convite para treinar o F. C. Porto B, entre 2001 até 2004. 

Na época de 2006/2007 treinou a U. Leiria e a Académica de Coimbra. Finalmente, surgiu o Sporting de Braga na época de 2009/2010 onde foi vice-campeão nacional, levando a equipa a participar na Liga dos Campeões Europeus.

Sem grandes jogadas estudadas, nem tácticas muito elaboradas Domingos Paciência na primeira pessoa.


Lembra-se de como nasceu o gosto pelo futebol?

Acho que nasceu muito cedo, com cinco anos já gostava de jogar à bola no bairro, estar com os meus colegas. A partir dos oito comecei a gostar a sério, a entrar em torneios de futsal com a Académica de Leça, com a Portuguesa de Leça.


Com colegas que viriam mais tarde a tornar-se figuras no futebol?

Um foi o Vítor Baía. Conseguimos caminhar juntos até à alta competição, mas houve outros que tentaram a sua sorte e não conseguiram. Ficaram pelos juvenis, pelos juniores. Também faziam parte dessas equipas da zona de Leça.


Em criança teve a oportunidade de gostar de matemática?

Não, para ser honesto, contas comigo era mais complicado.


Tem três filhos, todos gostam de futebol. E de matemática?

Noto que o mais velho gosta de resolver qualquer situação. Facilmente resolve um problema mentalmente. Portanto, creio que o mais velho é aquele que está mais preparado.


Como jogador a sua camisola era o 9? Alguma razão especial na escolha deste número?

Foi mais pela posição em campo. Sempre quis jogar na posição do Fernando Gomes ou do Néné, que eram o número 9. Era o homem goleador, que decidia os jogos, daí a apetência para o número 9.


Comente a afirmação: “A Matemática e o futebol necessitam de muito esforço e trabalho diário”!

Sim, completamente. O treino leva a procurar a resolução de muitos problemas. Acho que quanto mais treinarmos mais preparados estamos. Se deixarmos de treinar determinada função ou acção do jogo, ao fim de um tempo sentimos necessidade dessa acção e há que voltar a treinar. Na Matemática penso que também é assim: se deixarmos de pôr a cabeça a pensar e a trabalhar, daqui a uns tempos vamos ter dificuldade em resolver situações e acho que nesse sentido existe uma analogia.


Um dos ramos da matemática é a estatística, que é utilizada no futebol para estudar os jogos e os adversários. É uma ferramenta que utiliza enquanto treinador?

Sim. A Liga de Clubes entrega-nos um dossier a seguir aos jogos com todas as análises, desde o tempo de posse de bola, aos remates à baliza e à zona onde essa acção aconteceu.


É uma ferramenta importante…

É, porque acabamos por fazer uma análise sobre os jogadores e a sua eficácia. Aqueles números, por vezes, traduzem o rendimento do jogador.


Um jogador seu faz dois remates à baliza e marca um golo. Qual é a percentagem de sucesso deste jogador?

Essa é fácil, 50 por cento.


Em casa as pessoas perguntam: como é possível, com uma baliza de 7,32 metros por 2,44, numa área de 17,86 metros quadrados, haver jogadores que falham?

A bola torna-se mais rápida ou mais lenta consoante o passe, a decisão e o enquadramento. Quando se consegue colocar todos estes aspectos em harmonia, a finalização pode ser perfeita. Quando não se consegue, é porque houve qualquer coisa que falhou ou é por mérito da defesa. Numa situação de penalty, por exemplo, a força mental do jogador tem muito mais influência do que a qualidade do atleta.


Dá jeito ter bons jogadores numa equipa…

Muito. Hoje em dia é fundamental ter os melhores jogadores, porque acabam por interpretar melhor os aspectos tácticos e técnicos, mas também por questões físicas e psicológicas. A fasquia é muito alta e existem jogadores que conseguem alcançá-la.


Para si 4x4x2 são 32 ou é uma táctica de futebol?

Dentro da minha área ou da minha profissão não é uma táctica, mas um sistema.

 

A lei do fora de jogo dá muitos problemas e origina muitas soluções erradas. Concorda?

Sim. Para o fiscal de linha conseguir manter o olhar na bola, no momento em que ela sai, e, ao mesmo tempo, ver a posição do último defesa. Isto necessita de uma sincronização tão rápida que, por vezes, a decisão não é a melhor, o que dá muitos problemas.


"Se A é o sucesso, então é igual a X mais Y mais Z. O trabalho é X; Y é o lazer; e Z é manter a boca fechada." Esta frase pertence a Albert Einstein. Acha que no futebol se fala demasiado ou este é um mal necessário?

Sim, por vezes fala-se demasiado. Nos países onde o futebol tem uma importância muito grande, como em Espanha, onde tive oportunidade de jogar, fala-se de mais. Porque há muitos jornais desportivos, acho que são jornais desportivos a mais e, além destes, existem jornais diários que falam também de desporto. Se fizermos um apanhado das pessoas que estão à volta do futebol, como analistas e cronistas e de pessoas das várias áreas que nada têm a ver com o futebol, é uma barbaridade. Porque o médico pode falar de futebol, o trolha pode falar de futebol, o engenheiro pode falar de futebol, toda a gente pode falar de futebol. E nós não podemos falar de medicina, de engenharia... Por isso é que se fala de mais do futebol, porque mexe com o País. Por vezes até se fala de futebol para encobrir muitas medidas implementadas pelo Estado.


Um dos melhores matemáticos contemporâneos, Bento de Jesus Caraça, afirmou que “…se não receio o erro é porque estou sempre pronto a corrigi-lo." Enquanto treinador de futebol como encara o erro?

Eu não encaro o erro com naturalidade. Se treinamos para estar preparados para que o erro não aconteça e ele acontece, alguém falhou. E a minha primeira reacção, enquanto treinador, é saber se fui eu que falhei. Se vir que não fui eu, vamos assumir o erro com quem o cometeu.


Na matemática temos um conceito de infinito (∞). Alguma vez sentiu que um jogo nunca mais acabava?

Várias vezes. Quando o árbitro levanta a placa com um tempo de compensação de 3 ou 4 minutos, se estiver a ganhar por 1-0, esse tempo não passa nunca. Se estivermos a perder, passa num abrir e fechar de olhos. Esses minutos, consoante o resultado não são iguais.


 “Braga por um Canudo”  é uma expressão muito conhecida. O campeonato do ano passado…

Sim. Pena é que conseguimos manter esse canudo bem visível, com uma distância e uma paisagem bonitas durante muito e muito tempo. Acabámos por ver “Braga por um canudo” mesmo na última jornada, mas alimentámos o sonho, levámos muitas pessoas a acompanhar-nos, e acabou por ser um ano diferente de todos os outros, que ficou marcado no futebol português.


A frase de Theodore Roosevelt  "É muito melhor arriscar coisas grandiosas, alcançar triunfos e glórias, mesmo expondo-se a derrotas, do que formar fila com os pobres de espírito que nem gozam muito, nem sofrem muito, porém vivem nessa penumbra cinzenta que não conhece vitórias nem derrotas." As suas equipas têm esta filosofia?

Tive oportunidade de dizer que o empate não deveria existir no futebol. Alguém tem de perder. Muitas vezes chego ao final de um jogo e sinto que o empate a mim não me satisfaz. Prefiro arriscar e tentar ganhar do que ficar parado à espera que a derrota aconteça.


Era capaz de dedicar uma vitória pela matemática?

Dedicaria uma vitória à matemática se através dela conseguisse uma táctica que me permitisse marcar golos, e, por consequência, ganhar jogos. 


Um conselho matemático para as crianças e jovens deste País.

Um conselho matemático…"estejam atentos ao presente que no futuro vão ter de fazer muitas contas".

 



A mensagem de Domingos Paciência:

 "Estejam atentos ao presente que no futuro vão fazer muitas contas"