À Distância por Daniel Folha

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião maio de 2015

 



 

 

Distâncias (quase) infinitamente grandes e distâncias (quase) infinitamente pequenas estão intrinsecamente relacionadas no Universo de que fazemos parte e que aos poucos vamos tentando conhecer melhor. Nesta rubrica escreverei algumas palavras, e números (!), sobre o Universo que vemos quando olhamos para um céu estrelado numa noite límpida. Uma modesta contribuição para ajudar a reflectir sobre a nossa posição no contexto cósmico.                                                                                                                 


Daniel F. M. Folha - Diretor Executivo do Planetário do Porto - Centro CIência Viva, astrónomo do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço, Professor Auxiliar Convidado do Instituto Superior de Ciências Saúde – Norte (ISCS-N) e elemento do CIENCEDUC - Educação para as Ciências (Departamento  de Ciências do ISCS-N)   

 


À Distância por Daniel Folha - Planeta Sim, Planeta Não, Planeta Anão!

Artigo de maio de 2015 - Dia 13    

Clube de Matemática SPM

Facebook Clube SPM


Título: 
Planeta Sim, Planeta Não, Planeta Anão!


Viajemos no tempo, para 1780. São conhecidos seis planetas no Sistema Solar: Mercúrio, Vénus, Terra, Marte, Júpiter e Saturno. Uma curiosa série numérica permite obter o comprimento do semi-eixo maior da órbita dos planetas em função da sua sequência ordenada a partir do Sol. É a Lei de Titius-Bode. Se “a” for o comprimento do semi-eixo maior da órbita de um planeta, esta Lei diz-nos que a = 0.4 + 0.3 x 2m, para m = -∞, 0, 1, 2, ..., com “a” expresso em unidades astronómicas (UA).  A discrepância entre os valores conhecidos e os previstos pela Lei de Titius-Bode é de apenas alguns pontos percentuais. Chegamos a março de 1781 e William Herschel anuncia a descoberta de um novo planeta... Úrano. A órbita do primeiro planeta a ser descoberto com o auxilio de um telescópio tem o semi-eixo maior com um comprimento de 19.2 UA, valor bem próximo das 19.6 UA previstas pela Lei de Titius-Bode!!

De acordo com a série numérica deveria existir um planeta entre as orbitas de Marte e Júpiter, a cerca de 2.8 UA do Sol.  Mas tal planeta é desconhecido. Esta é única falha da Lei de Titius-Bode!! Avancemos 20 anos... Estamos em 1801 e neste ano é descoberto um corpo celeste no local esperado. É o triunfo da Lei de Titius-Bode e o Sistema Solar ganhou mais uma planeta... Ceres. O triunfo dura cerca de meio século. Em 1846 é descoberto o planeta Neptuno, a 30 UA do Sol, ou seja quase 9 UA mais próximo do Sol do que o esperado pela Lei de Titius-Bode. Em 1930 descobre-se Plutão, cuja órbita tem um semi-eixo maior que é cerca de metade do esperado por aquela Lei. A Lei de Titius-Bode parece ser apenas resultado de uma coincidência matemática mais do que uma lei da natureza.

Se regressarmos ao final da primeira década do Séc. XIX encontramos o Sistema Solar com 11 planetas: os seis conhecidos da antiguidade, aos quais se acrescentaram Úrano, Ceres, Pallas, Juno, e Vesta. Estes três últimos descobertos respetivamente em 1802, 1804 e 1807.

Seguimos para meados do Sec. XIX... O número de objetos encontrados a orbitar entre Marte e Júpiter aumenta significativamente. Estes objetos são suficientemente pequenos para terem o aspeto de estrelas quando visualizados nos telescópios da altura, mas possuíam movimento em relação às estrelas “fixas”, como os planetas, e orbitam o Sol. São os asteroides! Eventualmente Ceres deixou de ser considerado planeta. Era o maior dos asteroides.

Em 2006, no âmbito da União Astronómica Internacional, é elaborada uma definição de planeta e criada uma nova classe de objeto: o planeta anão, onde se incluem Ceres e Plutão, entre outros objetos menos conhecidos do público em geral.

Em órbita de Ceres, para estudar este planeta anão, está neste momento a sonda da NASA Dawn. Ceres é um objeto diferenciado, como a Terra, no sentido em que os materiais mais densos estão no seu núcleo e os menos densos estão mais próximos da superfície. Dada a densidade de Ceres e os minerais hidratados que parecem existir na sua superfície, é provável que no seu interior exista uma espessa camada de água sob a forma de gelo.

As imagens de Ceres obtidas pela sonda Dawn têm chegado com alguma regularidade. Bem no centro de uma cratera encontra-se uma mancha muito brilhante, qual farol no Sistema Solar! É uma região coberta de um material muito refletor, a natureza do qual está ainda por determinar. As observações da Dawn, com os diferentes instrumentos que leva a bordo, deverão permitir chegar a uma conclusão. Estaremos atentos!


 

Ceres observada pela sonda Dawn, com região muito brilhante no fundo de uma cratera. Crédito: NASA/JPL-Caltech/UCLA/MPS/DLR/IDA

Publicado/editado: 13/05/2015