Se e Só Se por José Carlos Pereira

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião fevereiro de 2016

               


Nesta coluna pretendo partilhar todos os meses a minha opinião sobre questões relacionadas com a Matemática e com o seu ensino. Os leitores são convidados a comentar, com argumentos a favor ou contra, aliás é esse o objectivo desta coluna: discutir diferentes pontos de vista sobre o tema do artigo (dia 3 de cada mês).


José Carlos da Silva Pereira – Professor de Matemática, autor de livros escolares e responsável pelo site Recursos para Matemática. Ler artigos anteriores aqui.



Se e Só Se por José Carlos Pereira - Informação, Tempo, Conhecimento

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião fevereiro de 2016

 

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Título: Informação, Tempo, Conhecimento


No último mês foram muitas as alterações introduzidas ao sistema de ensino português pelo novo responsável pela Educação em Portugal, o ministro Tiago Brandão Rodrigues. De todas as alterações efectuadas, a mais polémica e a que mais tinta fez correr foi a suspensão dos exames dos 4.º e 6.º anos e a introdução de provas de aferição nos 2.º, 5.º e 8.º anos, medida com a qual concordo. 


No entanto, não é deste assunto que quero falar neste artigo mas sim dos programas, mais especificamente do Programa de Matemática A do Ensino Secundário! Sim, volto a repetir o tema do artigo do mês passado, porque entendo que se justifica. Depois destas primeiras medidas, é necessário que a equipa ministerial avalie seriamente a forma como decorre a implementação do Novo Programa e Metas no 10.º ano, neste ano letivo de 2015/1016, para que possa actuar de forma informada e consciente e de modo a minimizar os efeitos negativos que se observem.


Os atrasos que relatei no artigo de Janeiro tendem a aumentar rapidamente e, decorrido um mês do início do segundo período, é já possível constatar esse facto. Por exemplo, conheço casos, e não são poucos, de turmas que neste momento têm mais de um mês de atraso em relação à planificação inicial. Isto representa pelo menos dezasseis tempos lectivos. Se pensarmos que para o final do ano lectivo faltam quatro meses de tempo útil de aulas, não deixa de ser muito preocupante. Como vão estes alunos aprender os conteúdos que fatalmente não vão ser leccionados? 

 
Há dias encontrei no Facebook uma imagem animada que associei imediatamente ao Programa em vigor:



É essencial que clique aqui para ver a imagem animada


Acto contínuo, partilhei-a na minha página e no grupo “Recursos para Matemática” com a seguinte legenda:


“Algo que resume bem o novo Programa de Matemática A do Ensino Secundário (já agora do Ensino Básico também)...

Muita informação, pouco tempo para a assimilar, conhecimento quase nulo!”


Exagero da minha parte? Não creio! As reacções foram muitas, vários colegas se identificaram tanto com a imagem como com a legenda que lhe associei.   

A verdade é esta: o programa é exageradamente extenso e formal. Para ser cumprido, todos os seus conteúdos teriam de ser leccionados a grande velocidade e num curto espaço de tempo. Ora, como diz o ditado “depressa e bem não há quem”! Não é possível ensinar a grande velocidade conteúdos que exigem um considerável nível de abstracção e de tempo para serem assimilados correctamente. Consequentemente os resultados não serão positivos – o que se está também a verificar.  

 
Há um ano, as dúvidas quanto à exequibilidade deste programa eram apenas hipotéticas, apesar de a experiência nos dizer que muito dificilmente seria possível cumprir tudo o que o programa exige. Neste momento essas dúvidas dissiparam-se e, como tal, é imperativo uma intervenção rápida e decidida por parte do novo Ministro. 


No artigo do mês passado escrevi:


“É necessário que se faça imediatamente um balanço da situação e, na minha perspectiva, é necessário um reajuste em termos de conteúdos e que se redimensione o programa.”


Mas será que reajustar e redimensionar o programa é o suficiente? 


Depois de verificar que durante o primeiro mês de aulas do 2.º período a situação ainda se degradou mais, algo que pude constatar em conversa com vários colegas sobre este assunto, estou convicto que não será suficiente!
 
O que fazer então? 


Uma das opções seria reformular profundamente o programa dos três anos, eliminando alguns conteúdos e alterando outros (procedendo da mesma forma em relação às metas), por forma a torna-lo exequível e equilibrado e, quiçá, a aproximá-lo do programa antigo. Uma segunda solução seria a de introduzir alterações e adaptações nos currículos dos 10.º e 11.º anos, de modo a suspender o programa no final do próximo ano lectivo, e assim permitir que o currículo do 12.º ano no ano lectivo seguinte seja o do programa antigo. Finalmente, uma terceira via, mais “radical”, seria suspender já, ajustando o currículo do 10.º ano de modo que no próximo ano lectivo o 11.º ano possa ser leccionado com o programa antigo. Obviamente, no ano lectivo seguinte o 12.º ano também seria leccionado com o programa antigo. Qualquer uma das três soluções teria a minha concordância! 


Concordo que a estabilidade no sistema educativo é um valor maior. E nesse sentido, uma eventual interrupção na implementação deste Programa poderá ser encarado como negativo. No entanto, deixar tudo como está será muito mais negativo, com custos futuros que serão certamente elevados. 


Claro que tudo deve ser feito estabelecendo consensos e em diálogo: com os professores no terreno; com as associações de professores; com os autores dos programas (do novo e do antigo) e também com as editoras – não nos podemos esquecer que os manuais do 11.º ano estão neste momento a ser produzidos. Futuramente é necessária a colaboração de todos para a construção de um currículo consensual e estável, algo que seria muito benéfico para o ensino da Matemática.


Mais uma vez, convido todos os professores de Matemática que estão a leccionar 10.º ano a deixar um comentário com as suas preocupações na página do Facebook do Clube SPM


Publicado/editado: 03/02/2016