Intersecções por Daniela Gonçalves - Interrogar é uma arte de “cabeças bem feitas”

Eixos de Opinião de Março de 2020

Daniela Gonçalves - Professora do Ensino Superior na ESE de Paula Frassinetti e Investigadora na Universidade Católica Portuguesa, Centro de Investigação para o Desenvolvimento Humano, Portugal (Ver +)


Título: Interrogar é uma arte de “cabeças bem feitas”

“A arte de interrogar é bem mais a arte dos mestres do que a dos discípulos; é preciso ter já aprendido muitas coisas, para saber perguntar aquilo que não se sabe” (Jean-Paul Sartre).

Ser professor, em meu entender, é uma arte de criar as oportunidades necessárias para que cada um descubra a sua paixão, o seu talento e fazer isso a sua (atitude) vida, procurando sempre saber, mesmo sabendo que nunca saberá tudo e haverá sempre mais para saber. Sim, diria alguns e como? Mesmo não existindo receitas, considero que já conseguimos elencar alguns ingredientes: 
i) saber integrrogar - “(...) mais importante do que fazer a pergunta é saber fazê-la”; daqui resulta a necessidade de investirmos em processos educativos que fomentem o saber pensar, interrogar, expressar e comunicar as ideias, tendo em conta que são fatores essenciais para gerar oportunidades para cada um descubra a sua paixão.
ii) procurar constantemente - todos os dias encontro professores que procuram incessantemente encontrar a melhor resposta para aquele aluno/a. Não têm receios de saber que ainda há muito a saber. Investem na interrogação. Neste cenário, em particular, em saber como ensinar este/a aluno/a. Portanto, verifico de imediato uma intersecção curiosa: o saber como o desejo de saber mais; o saber implica esta procura constante, uma espécie de sede de mais conhecimento, porque se sabe que há ainda muito para saber. E tudo isto depende (também) da nossa arte de interrogar.

Tenho pensado muito sobre a paixão pelo ensino. Talvez seja a influência de estar em várias instituições de ensino onde esse sentimento é muitas vezes referido, apesar de algum cansaço, desânimo e descrença. Apesar disto, é mais fácil acreditar no discurso (e prática) de umas e pouco credível a afirmação de outras. E onde residirá a diferença?

Pensei sobre o assunto e considero que a paixão de um professor se expressa através do modelo e da referência que é capaz de ser. 

Um testemunho e/ou exemplo. 

Expressa-se pelo impacto comunicacional que vai conseguindo ter nos que o rodeiam, bem como pelo autoconhecimento e pela (pre)ocupação com os outros que evidencia diariamente. Expressa-se pela sua arte de interrogar. Expressa-se pela forma como interroga/questiona e oferece prioridade a “cabeças bem feitas” em detrimento de “cabeças cheias”. 

É exigido ao professor (apaixonado pelo ensino) que seja coerente com as regras e com os princípios éticos, morais e deontológicos que diz defender. É exigido ao professor (apaixonado pelo ensino) que assuma os compromissos não só com os resultados, mas também, e principalmente, com a melhoria contínua daqueles que ensina, deixando atrás de si uma herança de alun@s mais competentes, autónomos, conhecedores e questionadores. 

Publicado/editado: 08/03/2020