Contos de 3º Grau por José Veiga de Faria - Parte 5

E a história continua...

Título: A matemática do ferro de engomar...

  

Episódio I por Carlos Marinho - Dia 1

A dona Maria e o marido partiram para uns dias de férias no período da Páscoa. No seu antigo mercedes de 1998, o senhor António acelera na auto estrada em direção ao Algarve. Sairam do Porto às 7 da manhã e pelo cheiro estão a passar por Aveiro. - Que pivete! - diz o senhor António.- Está a cheirar-me a queimado! solta a dona Maria.- Não, queimado não! Cheira a fossa! - Retorquiu António.- Sabes, essa camisa que trazes vestida, passei-a antes de sair! - E... - E... acho que deixei o ferro ligado!- Tens a certeza?António viu a sua vida a andar para trás. Virou o seu bólide em direção à terra das francesinhas, não fosse encontrar um churrasco maior. Lembrando-se da tábua de engomar, fez pé na tábua em direção ao Porto.Uma hora mais tarde, entram em casa, não cheirava a esturro. Olharam para o ferro e ele estava bem...desligado!

Episódio III por Gonçalo F. Gouveia - Dia 6

O António de sempre, esse Gibraltar de paciência e fleuma, estava à beira desaparecer numa erupção de fúria quando a dona maria lhe pegou delicadamente na mão e postulou: 
– Não ligues filho, estou a ficar velhota… Sussurrou maliciosa, num balido de cabritinho que se oferece ao sacrifício. 
Conforme previsto o marido amansou num ápice e apressou-se a afiançar à esposa que estava mais nova que nunca e que velhota estava a mãe dela, quer dizer, não que a achasse velha, gaguejou aflito perante o olhar assassino da dona Maria, tentando perceber como se metera naquela imprudência e se haviam invertido tão subitamente os papéis depois da tontice do ferro de engomar. 
– Bom, o melhor é regressarmos à estrada, antes que o sol aqueça e a travessia aromática por Aveiro se torne insuportável, afirmou com um sorriso decidido. 
E já iam de facto a salvo, bem a Sul de Aveiro quando a dona Maria disparou: 
– Oh António, desligaste o ferro da tomada? Sabes que está avariado e trabalha sozinho, não sabes?

Episódio III por José Carlos Pereira - Dia 11

Ao dizer isto reparou que o rosto do seu marido começava a adquirir o tom encarnado que tão bem conhecia. Ainda pensou dizer-lhe: “como é que um portista ferrenho como tu fica tão encarnado?”, mas achou melhor não dizer nada.
O António bufava, mas também não disse nada. Na primeira oportunidade inverteu novamente a marcha e dirigiu-se ao Porto. Aqueles mais de 150 quilómetros foram feitos num silêncio sepulcral.       
Ao entrarem em casa, o António disse para a sua esposa: “Desta vez certifica-te que não teremos de voltar para trás! Já gastei metade do gasóleo nesta brincadeira.”
Depois de a dona Maria ter verificado tudo com precisão matemática, regressaram à estrada. A boa disposição voltou ao casal. Combinaram então parar em Aveiro para comprar uns ovos moles e seguir até à Mealhada para degustar o famoso leitão ao almoço. 
Chegados a Aveiro, compraram os ovos moles e, antes de seguirem até à mealhada, o António foi atestar o depósito do Mercedes. Ainda nem sequer tinham saído do posto de combustível quando o Mercedes começou a soluçar e a deitar um fumo denso e muito negro pelo tubo de escape. 
O rosto do António voltou a ficar encarnado e em português vernáculo balbuciava: “Tu queres ver, tu queres ver que eu fiz asneira!”. 

Episódio IV por José Carlos Santos - Dia 16

O António até era muito paciente com os outros, mas ficava de cabeça perdida com as próprias asneiras. Então como é que era possível ter posto gasolina quando o Mercedes era a gasóleo? A dona Maria não fazia ideia do que se podia estar a passar, mas já conhecia o marido suficientemente bem para não abrir a boca. Porém, olhou à sua volta e viu um funcionário do posto de combustível a vir a correr na direcção deles.
— Olha, António. Aquele senhor pode ser que nos ajude.
Mas assim que o funcionário chegou junto deles ficou imediatamente claro que não era para os ajudar que ele estava ali. O homem estava com uma cara de quem quem se queria enfiar num buraco, mas sem ter realmente a possibilidade de o fazer.
Então o funcionário explicou-lhes que a culpa não era do António mas do próprio posto. Tinham enchido de gasolina o reservatório de gasóleo uns minutos antes! E o António fora o primeiro cliente a passar depois disso. Ele ainda estava a arrancar quando os funcionário se aperceberam do engano, mas aí já era tarde.
O António, mas do que ficar furioso com os funcionários, ficou aliviado por não ter feito asneira. Mas que a viagem estava azarada, estava.

Episódio V por José Veiga de Faria - Dia 21

Que balde de água fria! Já não dava para ir ao Algarve. Lá se ia o Sol algarvio e os banhos na praia.
O António, embora aliviado pela ausência de culpa, o que não era de somenos para um espírito tão exigente consigo mesmo como o dele, estava desalentado. A mulher, que captava tudo, interveio de imediato:
- Olha homem, por trás de cada dificuldade está sempre uma oportunidade. Vamos ter o tempo de viagem reduzido, esquecer o doce calor algarvio mas o que perdemos em tempo vamos ganhar em profundidade afectiva.
- Como assim mulher, o que queres dizer com isso?
- A Carolina a namorada do nosso neto Francisco. Esqueceste está a passar uns tempos em Aveiro a estagiar no Instituto de Telecomunicações? Vamos aproveitar para reforçar os laços de família.
E pegando no telefone marcou o número e, quando a Carolina atendeu, contou a história. Depois de uma breve conversa disse ao marido:
- Ficou delirante, vem aí!
Entretanto, uma representante do posto de abastecimento dirigiu-se a eles para lhes pedir desculpa, garantir a recuperação do carro o mais breve possível e convidá-los para uma refeição com tudo à disposição no restaurante da estação.
E foi quando se lambuzavam com uma dose dupla de ovos moles que a porta se abriu de rompante e uns olhos negros, cintilando de alegria e entusiasmo, se aproximaram de braços abertos:
-Oh! avós ainda bem que ligaram, não calculam a novidade que tenho para vocês!

Episódio VI por Sílvio Gama - Dia 26

FIM 

 
Publicado/editado: 23/03/2018