Ideias Não Orientáveis por Inês Guimarães - Porque Tudo Vale a Pena...

Eixos de Opinião de Setembro de 2019

Inês Guimarães - Aluna de Mestrado em Matemática e Autora do Canal MathGurl no YouTube


Título: Porque Tudo Vale a Pena...

Olá a todos! O meu nome é Inês Guimarães, faço de conta que estudo matemática e sou o membro mais recente desta família. Nos últimos anos, dediquei-me bastante à divulgação da matemática para o público geral (lol, tenho credibilidade para isso sequer?) - criei um canal no YouTube sobre matemática, escrevi um livro, dei palestras em escolas, gravei uma pequena série... mas já queimei o arroz duas vezes durante esta semana. Enfim, agora que acabei de me apresentar, devo dizer que me vou apoderar deste espaço no Clube para escrever essencialmente aquilo que me vier à cabeça. Hoje apetece-me falar sobre diversidade na matemática.

Passei a primeira semana de setembro em Lisboa, numa escola de verão sobre teoria de probabilidade. Ainda bem que eu estava contratualmente obrigada a ir, porque senão tinha ficado em casa a queimar mais arroz. Foi uma experiência incrível. Se apanhei tudo aquilo de que se falou? Nem 10%, mas as pessoas que tive a oportunidade de conhecer fizeram valer a pena todas as crises existenciais despoletadas por eu me sentir burra como uma porta - nem sei como é que ainda ninguém descobriu este meu segredo e me proibiu de continuar a fazer matemática... (sim, Dra. Susana, já sei que preciso de trabalhar na minha autoestima, mas agora estou ocupada com outras coisas, ok?)

A sala estava repleta de estudantes oriundos das mais diversas partes do mundo (e arredores, desconfio), algo que me fez refletir sobre estereótipos e preconceitos. Muitas vezes, eu penso que alguém só é realmente bom a matemática se fizer isto ou aquilo, se pensar assim ou assado e isso, sim, é uma estupidez. Ai porque este escreve com a mão esquerda, porque aquele joga xadrez... r-i-d-í-c-u-l-o. Cada vez mais acho que qualquer pessoa pode desenvolver uma relação agradável com a matemática, embora não haja nenhuma receita universal que o permita alcançar. Soube hoje que há gente a trabalhar em álgebras não associativas no Madagáscar, o 9º país mais pobre do mundo, e uma das pessoas que mais dores de cabeça deu aos matemáticos, ao lançar problemas difíceis, graduou-se em Direito. Podemos nem trabalhar muitas horas, nem ser muito inteligentes, e até usar as unhas pintadas de preto com glitter enquanto comemos pimentos crus durante a pausa de almoço entre as aulas (sim, eu vi isso) – o importante é sentirmos a matemática como parte integrante do nosso organismo.

O meu professor favorito na escola de verão foi um senhor chamado Persi Diaconis. Aos 14 anos, ele saiu de casa e nunca mais voltou, tendo acompanhado um mágico numa digressão de espetáculos. Por viver imerso em truques de cartas e jogos de azar, começou a interessar-se por probabilidades, mas só aos 24 anos é que decidiu estudar matemática formalmente. Hoje em dia, ocupa uma importante cátedra na Universidade de Stanford, sendo um académico de excelência, um mágico notável e um orador fenomenal. Do seu ponto de vista, mais do que aprendermos as cadeiras standard de álgebra, análise, topologia ou combinatória, a melhor forma de descobrir o mundo da matemática é pegar num problema do nosso interesse e tentar resolvê-lo com garra e determinação. E podem ser questões tão simples e corriqueiras como entender as várias formas de baralhar cartas ou a distribuição das pessoas pelos lugares de uma sala... Porque tudo vale a pena quando a alma não é pequena.

Se quiserem comentar este artigo, passem pela página de Facebook do Clube de Matemática e, se me quiserem chatear, escrevam para inesguimaraes42@gmail.com.

Muito obrigada e até daqui a um mês! 

Publicado/editado: 18/09/2019