Se e Só Se por José Carlos Pereira - “Fake Images” – Um Pequeno Desabafo

Eixos de Opinião de dezembro de 2018

Título: “Fake Images” – Um Pequeno Desabafo

As redes sociais são locais férteis para a difusão de notícias falsas, as tão badaladas “fake news”, de mensagens, de imagens ou de textos cujo principal objectivo é a obtenção de visualizações, gostos, partilhas e de criar alarido. Quase sempre, este tipo de publicações passa uma ideia distorcida, ou mesmo falsa, da realidade. É um problema que está na ordem do dia e cuja única solução é a de alertar os utilizadores destas redes para estarem atentos a estas armadilhas de modo a não as difundir. 

Há dias o meu feed de notícias Facebook foi “invadido” pela seguinte imagem, de um autor que desconheço: 

Naturalmente que uma boa parte dos comentários que a acompanhavam incluía palavras como, “tristeza” e “vergonhoso” ou expressões como “o ensino em Portugal vai de mal a pior”. O propositado exagero da imagem atingiu os seus objectivos: criar o tal alarido e obter um efeito viral.   

Entendo que quem esteja de fora e não conheça minimamente o sistema de ensino em Portugal partilhe esta imagem como se a mesma fosse um fiel retrato da realidade. Já não o entendo quando são professores a fazê-lo. Ao sermos nós a partilhar estas publicações passamos e reforçamos a ideia errónea de que é exactamente assim e que o caminho do ensino da Matemática foi apenas o de se tornar-se facilitista – muitas vezes sob a ideia de que antigamente é que as coisas eram difíceis – e que em vez de evoluir, o ensino da Matemática regrediu. Não é assim e nem sequer está próximo da verdade! Deixo alguns exemplos de temas que são leccionados no Ensino Secundário, onde tenho maior experiência, e que, na minha perspectiva, contrariam o que a imagem parece querer transparecer: os problemas de Combinatória que são propostos actualmente são bem mais complicados do que aqueles que eram propostos há vinte anos. Mais que isso, parece que de ano para ano o nível de dificuldade aumenta! E os limites que exigimos que os alunos resolvam, sem recorrer à regra de Cauchy? Algo que há trinta anos era resolvido aplicando-a! E a Geometria? É reconhecidamente um dos temas mais importantes e difíceis dos actuais programas. No meu tempo de estudante nem sequer era abordado. 

Não podemos querer que o ensino do século XXI seja igual ao do século passado. A escola, e em particular, o Ensino da Matemática, deve acompanhar a evolução social e tecnológica e tem de estar em linha com o tempo em que vivemos. Porque hoje em dia existem calculadoras gráficas, programas dinâmicos e metodologias do ensino da Matemática de que há uns anos nem sequer se falava. Há no entanto conteúdos matemáticos que pela sua importância e relevância para a aprendizagem da Matemática são transversais no tempo, pelo que não será surpreendente que daqui a cem anos se continue a ensinar Trigonometria, Geometria, Funções e Combinatória, possivelmente não da mesma forma. Outros temas surgirão no currículo, talvez até temas que ainda não foram inventados mas que na altura serão de extrema importância!  

Reconheço que as particularidades dos alunos de hoje são diferentes, talvez sejam alunos menos interessados, ou antes, menos interessados na escola. É difícil para a Escola competir com todas as solicitações mais apelativas com que os alunos são bombardeados diariamente. É difícil fazê-los perceber que só com trabalho poderão atingir o sucesso. No entanto são estes mesmos alunos que nos últimos anos têm conseguido, com a ajuda dos seus professores, os melhores resultados de sempre nos testes internacionais (PISA e TIMSS). Ainda temos um longo caminho a percorrer para chegarmos ao nível dos melhores, mas a verdade é que estamos bem melhor do que quando começámos a participar nestes testes. Parece-me que estamos a evoluir no sentido certo, não obstante de ainda termos muito trabalho pela frente, nomeadamente na definição cabal dos conteúdos programáticos. Neste momento encontramo-nos num limbo entre o Programa e Metas Curriculares (PMC) e as Aprendizagens Essenciais (AE), com umas escolas a seguir o PMC e outras a seguir as AE. 
 
Para finalizar, é importante que não sejamos nós a passar uma ideia errada, mesmo que intencionalmente exagerada, daquilo que ensinamos nas nossas aulas e da exigência com que o fazemos. Aquilo que para muitos é uma sátira caricaturada pode ser entendido por muitos outros como a expressão fiel da realidade. 

Convido o leitor a deixar o seu comentário a este artigo na página do Facebook do Clube SPM. 

Publicado/editado: 03/12/2018