Foi Freud (1937) quem mencionou as três profissões impossíveis: a de
psicanalista, a de governante e a de professor. Deixemos a discussão em torno
das duas primeiras e não aprofundemos a questão da profissionalidade da governação. Centremo-nos na docência e na sua
progressiva impossibilidade.
Impossível profissão, esta de fazer aprender todos os alunos que nos são
confiados. Porque alguns não querem aprender o que prescrevem que eu ensine;
porque o prolongamento arbitrário da
compulsão escolar de 12 anos cria ambientes explosivos; porque é impossível
ensinar segundo as necessidades individuais de cada aluno, diferenciar
sistematicamente as condições de aprendizagem, realizar uma avaliação
personalizada quando se tem semanalmente de interagir com cerca de 200 alunos;
porque as condições de trabalho têm vindo a ser progressivamente mais complexas
e exigentes; porque o valor social da
educação anda pelas ruas da amargura; porque
a mobilidade social ascendente já quase não existe, estando mesmo em regressão;
porque os climas e as culturas escolares se mantêm numa contínua instabilização
que tornam precários os vínculos profissionais e organizacionais; porque o Diário da República continua a sua fúria
de prescrição e de inutilidade, decretando a destempo e definindo regras quando
o jogo vai já a meio.
Mas se a profissão sempre foi impossível, desde 2008 – com a aplicação
do novo ECD - cresceu exponencialmente a natureza da sua impossibilidade. Com
os professores a serem progressivamente desautorizados, menorizados e
colonizados por um sistema hipercentralizado; a verem o seu tempo de
aprisionamento escolar aumentado, muitas
vezes em tarefas inúteis; a terem de exercer o ofício de guardadores de rebanhos numa prática de desprofissionalização destrutiva; a
sentirem a exaustão perante tantas exigências muitas delas sem sentido e sem
qualquer alcance pedagógico (de que os planos
de recuperação agora formalmente extintos foram um exemplo); a verem o
crescimento da confrontação pública e a exposição derivadas dos rankings que parecem cumprir sobretudo a
missão do nomear e do envergonhar.
Mas o último golpe parece estar agora para vir, com o efeito conjugado
de duas medidas de destruição massiva: o aumento do tempo do horário de
trabalho para 40 horas semanais e com o crescimento do tempo letivo para um
horário semanal entre 25 e 27 horas e o prolongamento da idade da reforma para
os 65 anos.
Passar a ter mais alunos por turma; passar a ter mais turmas; passar a
ter de ensinar (e avaliar) semanalmente entre 150 e 250 alunos; ter de lecionar
várias horas seguidas a turmas diferentes, tendo todos os dia de interagir com
muitas dezenas de alunos com perfis, expetativas e disposições diferentes vai
ser uma prática de uma extrema violência e de um desgaste incalculável.
Nenhuma profissão tem esta exigência. Merece, por isso, extrema atenção
e cuidado. E o mais largo e consistente reconhecimento e apoio. Sob pena desacrificarmos definitivamente o futuro.