Entrevista a José Carlos Pereira, Professor de Matemática

Entrevista Clube SPM

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O entrevistado do mês de julho do clube de matemática da spm é José Carlos Pereira – Licenciado em Matemática pela FCUL, explicador, autor de manuais escolares e escreve o artigo de opinião nos "eixos de opinião" "Se e Só Se" desde setembro de 2013. Da infância à atualidade, passando pelos melhores momentos com a matemática veremos todas as explicações, através de um manual simples, equivalente ao sumário de uma vida dedicada à alma mater de todas as ciências. Quer uma explicação mais detalhada, leia aqui:

Nasceste em Lisboa. Como “explicas” a tua infância?
Sim, nasci em Lisboa, mas toda a minha infância foi passada numa localidade do concelho da Amadora, A-da-Beja. A minha infância foi, no essencial, passada na rua, a jogar à bola, ao berlinde ou a percorrer o pinhal sobranceiro à casa onde cresci. Muitos joelhos e cotovelos esfolados e algumas zaragatas.  

O que te lembras da escola primária?
O “edifício” onde funcionava a escola onde fiz a minha primária já não existe. Era um pré-fabricado que entretanto foi demolido. Tenho boa memória dessa fase da minha vida. Lembro-me muito bem do primeiro dia de aulas e de ter sido acompanhado pela minha mãe. Lembro-me de quase todos os meus colegas, visto que sendo A-da-Beja uma aldeia, todos se conheciam. Na verdade a escola primária foi o prolongamento da infância, os colegas de escola eram os meus amigos de infância, as brincadeiras dos primeiras anos eram replicadas no recreio. Lembro-me de ter uma preocupação quase obsessiva por cumprir tudo o que me era pedido na escola. Lembro-me muito bem, com muito carinho, das minhas duas professoras primárias, as professoras Ana Maria e Maria Ana. 

Eras bom aluno a matemática?
Era um aluno razoável. Até ao 9.º ano nunca tive dificuldades na disciplina, mas nunca fui brilhante. O 10.º ano foi o melhor, os dois seguintes não foram tão bons.

O que te fascina na matemática?
A Matemática não mente. A Matemática abala as nossas convicções, por mais enraizadas que elas sejam. Já me aconteceu muitas vezes estar convencido da veracidade de um determinado resultado e, passado algum tempo, vem a Matemática, de mansinho, e diz-me “meu caro amigo, olha que isso não é bem assim!”. Isso é fascinante.  

Tiraste a licenciatura na FCUL. Como foi esse curso?
Foi difícil, exigente e absorvente, mas também foi muito enriquecedor! Uma boa formação é essencial para o nosso futuro e o curso de Matemática que completei na FCUL preparou-me bem para os desafios que iria enfrentar. Quando o terminei senti uma enorme felicidade.

De Lisboa para Fátima foi uma grande mudança. Foi alguma promessa…
Foi o casamento… de certa maneira foi uma promessa. 

Escolheste a via das explicações. Por que razão não estás a lecionar numa escola?
Não foi propriamente uma escolha, aconteceu naturalmente. Quando fui para Fátima não queria ficar muito longe de casa, afinal tinha mudado de Lisboa para Fátima e não queria mudar-me novamente, pelo que os concursos que fazia eram sempre limitados na distância. Naturalmente não fiquei colocado nos primeiros anos. Durante o tempo de faculdade já tinha dado algumas explicações, tinha todos os anos meia dúzia de alunos, mas foi em Fátima que comecei a “sério”. No início era apenas enquanto não surgia uma colocação, mas passados dois ou três anos decidi deixar de concorrer e dedicar-me totalmente às explicações. Pesando todas as vantagens e desvantagens da minha actividade, acho que tomei a decisão certa. Actualmente tenho uma Sala de Estudo onde desenvolvo esta minha actividade. 

A Cláudia também é professora de Matemática. Falam muito de Matemática em vossa casa?
Não falamos muito, mas de vez em quando é um assunto que surge nas nossas conversas.

És autor de um livro de preparação para o Exame Nacional de Matemática A. Como surgiu a ideia?
Nunca pensei que alguma vez estaria envolvido num projecto deste tipo. As minhas colegas já tinham escrito alguns livros para a Raiz e quando a editora as convidou para escrever o livro elas acharam que eu podia ser uma boa ajuda. Convidaram-me e eu demorei meio segundo a aceitar. Entreguei-me de corpo e alma. Tudo o que envolve este livro tem ocupado uma boa parte do meu tempo nos últimos nove anos. 

És muito ativo nas redes sociais na área da matemática. Queres falar-nos desses projetos?
Durante muitos anos fui resistindo às redes sociais. Aderi ao Facebook mais ou menos na altura em que o meu livro saiu. A ideia era usá-lo para fazer a divulgação do livro, o que se veio a verificar. Mais tarde surgir a primeira página, o Recursos para Matemática, onde ia partilhando alguns dos materiais que ia produzindo. Passado algum tempo, para facilitar a partilha dos meus materiais, criei o site e depois abri o grupo Recursos para Matemática. O grupo agrega um grande número de professores de Matemática e funciona como um local de partilha e discussão de tudo o que tenha a ver com a Matemática. Há cerca de três anos criei com dois amigos o MathSuccess. O projecto foi pensado para ser uma plataforma de explicações online, que o é, mas rapidamente englobou uma componente de partilha de materiais, fichas de trabalho e provas modelo. É um projecto que tem duas componentes: uma comercial e outra de acesso livre. 

És adepto do Benfica. A “lógica” para esta escolha é…
… simples. O Glorioso emociona-me.  

Colaboras com o clube de matemática desde setembro de 2013. Escreves nos eixos de opinião a rubrica “se e só se”. Belo nome para uma rubrica, como surgiu o convite?
Surgiu através do Carlos Marinho. Foi surpreendente. Apesar de não ter a certeza se iria conseguir corresponder ao convite, aceitei quase de imediato. 

Como está a ser a experiência de escrever mensalmente sobre matemática ao longo de quase seis anos no clube SPM?
É um desafio difícil. Todos os meses, por volta do dia 20, começo a pensar no artigo. Muitas vezes é complicado encontrar um tema, mas até hoje tenho conseguido. Já são mais de sessenta artigos! Acredito que a minha forma de escrever tem melhorado. Neste processo tem sido essencial a ajuda da Ana Madaleno, uma amiga de longa dada que todos os meses revê criticamente o que eu escrevo. Já agradeci muitas vezes a contribuição dela, mas nunca o fiz publicamente. Fica aqui o meu reconhecimento. 

Como defines o clube de matemática da SPM?
Interessante, dinâmico e útil. 

O matemático Alfred Rényi disse um dia que “quando estou infeliz trabalho em matemática para ficar feliz. Quando estou feliz, trabalho em matemática para me manter feliz”.  Já descobriste um “corolário” ou “teorema” para a tua felicidade?
É uma das minhas citações preferidas. Encontrei o teorema da minha felicidade há cerca de cinco anos. Chama-se Cláudia. 

Publicado/editado: 01/07/2019