Se e Só Se por José Carlos Pereira

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião novembro de 2015

               


Nesta coluna pretendo partilhar todos os meses a minha opinião sobre questões relacionadas com a Matemática e com o seu ensino. Os leitores são convidados a comentar, com argumentos a favor ou contra, aliás é esse o objectivo desta coluna: discutir diferentes pontos de vista sobre o tema do artigo (dia 3 de cada mês).


José Carlos da Silva Pereira – Professor de Matemática, autor de livros escolares e responsável pelo site Recursos para Matemática. Ler artigos anteriores aqui.



Se e Só Se por José Carlos Pereira - Rodando e Permutando - Parte I

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Título: Rodando e Permutando - Parte I



O conteúdo do artigo deste mês, e pelo menos também do próximo, é o resultado de uma conversa muito proveitosa que tive com um amigo. Sobre o tema dessa conversa, comentava ele a dada altura: “levanta sempre muitas dúvidas e há pouca literatura sobre o assunto”, o que de facto é verdade. A nossa conversa foi sobre permutações circulares e é sobre esse tema que vou escrever.

 
Uma boa maneira de abordar este assunto é com exemplos. Vejamos então.


Suponhamos que temos cinco amigos, a Alice (A), a Beatriz (B), a Carolina (C), o Diogo (D) e o Emanuel (E). Se os quisermos sentar num banco corrido com cinco lugares, de quantas maneiras distintas se pode fazê-lo? 


Para quem tem algumas noções de Combinatória, a resposta a esta questão não é difícil. É o número de sequências que se podem formar com cinco elementos distintos, neste caso, cinco pessoas. Este número é dado por 



De uma outra forma, podemos pensar que, se por exemplo, a Alice for a primeira a sentar-se, pode escolher qualquer um dos cinco lugares; em seguida, a Beatriz já só pode escolher um entre os restantes quatro e assim sucessivamente até chegarmos ao Emanuel que já só teria uma hipótese de escolha. Portanto, chegaríamos à mesma conclusão: o número de maneiras de os cinco se sentarem num banco corrido com cinco lugares é 




E, se em vez de ser num banco corrido, fosse numa mesa circular com cinco lugares indistinguíveis e igualmente espaçados? Isto é, sem que haja maneira de distinguir os lugares. De quantas maneiras distintas (disposições distintas) se podem sentar?   


Aparentemente a resposta é a mesma, mas na verdade, não é. Uma das maneiras de sentar os cinco amigos é:




Pensando na representação deste esquema como se fosse uma fila, por exemplo, “cortando” a circunferência entre A e E e “esticando-a”, não esquecendo que as pessoas nas extremidades estão, na realidade, sentadas lado a lado, teríamos:





Com este esquema, é fácil de perceber que as seguintes disposições são a mesma, apesar de parecerem diferentes:




Na primeira situação, de os cinco amigos se sentarem num banco corrido com cinco lugares, estes casos são distintos e como tal têm de ser contabilizados dessa forma. Já na segunda situação, da mesa redonda, são o mesmo caso (se o leitor reparar, em todos eles a Alice está sempre sentada entre a Elisabete e a Beatriz), e portanto, estes cinco casos têm de ser contabilizados apenas uma vez. 


Assim, a resposta ao problema é:




ou seja, 


 


A exemplo do que fizemos na primeira situação, podemos fazer um raciocínio semelhante: o primeiro dos amigos que se for sentar, por exemplo a Alice, tem apenas uma hipótese de escolha, por os cinco lugares serem indistinguíveis; a partir daqui o procedimento é como se estivessem numa fila, a Beatriz tem quatro hipóteses para se sentar; a Carolina, três; o Diogo, duas e, finalmente, o Emanuel apenas uma. A conclusão é naturalmente a mesma, o número de maneiras de os cinco amigos se sentarem numa mesa circular com cinco lugares sem que haja maneira de distinguir os lugares é



Com estas duas resoluções também se deduz que se os lugares fossem distinguíveis a situação seria similar a sentarem-se num banco corrido com cinco lugares. Em geral, se tivermos n elementos distintos dispostos em círculo sem que haja maneira de distinguir as suas posições, o número total de maneiras de os permutar é dado por




No entanto, a questão que formulei neste artigo é muito específica e dá pouca ou nenhuma margem para outras interpretações. Mas nem sempre assim acontece. As questões deste tipo são quase sempre apresentadas num determinado contexto, como no exemplo seguinte:


“Cinco amigos vão almoçar a um restaurante. Só está disponível uma mesa circular com cinco lugares. De quantas maneiras distintas se podem sentar?”


Às vezes também é acrescentada a hipótese de os lugares serem indistinguíveis. A resposta que o autor de uma questão deste tipo espera que um aluno dê é




Porém, se pensarmos bem, é impossível que num restaurante não se possam distinguir os lugares de uma mesa circular. Há sempre uma janela, uma porta ou mesmo um centro de mesa que se encarregam de fazer essa distinção. Parece uma questão menor, um pormenor sem importância, mas na minha opinião não é. Eu já formulei questões deste tipo sem ter o cuidado de especificar o mais possível, de modo a não haver outra interpretação que não aquela que eu pretendia. Algumas das respostas que obtive estavam, do meu ponto de vista, erradas, mas faziam todo o sentido no ponto de vista do aluno. O que fiz quando isso aconteceu? Aceitei a resposta do aluno e passei a ter mais cuidado com as formulações. Aliás, tenho cada vez mais cuidado com as formulações das questões de Combinatória! 


Para finalizar, deixo algumas questões para serem respondidas pelo leitor e que serão alvo de análise no próximo artigo:

a) De quantas maneiras distintas (disposições distintas) se podem sentar os cinco amigos numa mesa circular com cinco lugares igualmente espaçados e indistinguíveis, de modo que as raparigas fiquem todas juntas? 

b) De quantas maneiras distintas se podem sentar os cinco amigos numa mesa circular com cinco lugares distinguíveis, de modo que as raparigas fiquem todas juntas? Esta situação é similar à de sentar os cinco amigos num banco corrido com cinco lugares de modo que as raparigas fiquem todas juntas?

Utilize a página do Facebook do Clube SPM para deixar o seu comentário sobre este tema e para deixar sua resposta a estas duas questões.



 O número total de permutações de n elementos distintos entre si é igual ao número total de sequências distintas que é possível obter com os n elementos. Esse número é dado por 


Publicado/editado: 03/11/2015