Título: O Advogado
1ª Parte Sílvio Gama - Dia 1
O João Ratão esperava o seu advogado numa esplanada do Rossio, enquanto revia, mentalmente, como desligar o seu nome do caso das “swaps” face ao desaparecimento de documentos sobre o assunto na noite anterior.
O seu advogado era um daqueles que aparece muitas vezes na televisão sempre que alguém importante e com dinheiro tem problemas com a justiça. Já na véspera, numa estação de rádio, o advogado tinha dito que o seu cliente estava inocente, usando uma argumentação semelhante à que tinha usado quando, há uns tempos atrás, um director desportivo teve um aborrecimento com o tribunal.
A inquietação começava a invadir o Ratão - o advogado já estava quase uma hora atrasado- quando o seu telemóvel tocou. Era o advogado.
2ª Parte por Paulo Correia - Dia 6
O Dr. Salvado explicou-se... a demora era justificada por uma reunião de emergência com o secretário de estado. Estava quase a chegar e tinha uma proposta tentadora.
O João ficou mais calmo... até receber outra chamada. Era alguém que se identificou como seu amigo e que estava na posse dos documentos desaparecidos. Estava disposto a entregá-los em troca de um gesto de “simpatia” de 20 000 euros.
Enquanto desligava o telefone chegou o advogado com a proposta. Ratão seria o bode expiatório do caso, sem prestar declarações, e receberia algum dinheiro e uma nomeação para diretor não executivo de uma grande empresa pública dentro de 3 ou 4 anos... até lá, deveria permanecer discreto.
João tentava decidir qual das propostas era a mais interessante... ou a mais indecente... estariam relacionadas?
Antes mesmo de mencionar o outro telefonema, perguntou ao advogado: O que faria o Dr. Salvado? Aceitava?
3ª Parte por Carlos Marinho - Dia 11
- Claro! Vamos ter umas poucas noticias, umas comissões de inquérito…mas no final fica tudo bem! Neste país nunca ninguém foi preso por corrupção…
- Tem a certeza , doutor?
- Claro…
O diálogo entre os dois é interrompido por uma chamada do amigo e sócio do Dr. Salvado, Manuel Pinheiro.
- Salvado, tens uma televisão por perto?
- Não…mas posso entrar no café aqui próximo.
- Faz isso...
Salvado e Ratão correram em direcção ao café da esquina "o independente".
Olharam para a tv, onde aparecia em grande rodapé "Última Hora", a tempo de ouvirem a jornalista dizer: "…o juiz Manuel Carneiro, conhecido como o justiceiro, poucos dias após a sua nomeação do processo das swapps, manda prender cinco elementos, entre os quais o ministro…
4ª Parte por José Carlos Santos - Dia 16
O João Ratão, após ouvir (e ver) as notícias por mais um minuto ou dois virou-se para o advogado e perguntou, furioso:
— Nunca ninguém foi preso por corrupção? E alguma vez tinham prendido um ministro em Portugal?
Afastou-se imediatamente. Continuava furioso, mas agora não tinha dúvidas quanto ao que precisava fazer: eliminar os documentos comprometedores a qualquer custo. Contactou o «amigo» que os tinha mas só puderam combinar um encontro para daí a três dias, pois era o tempo de que o João Ratão necessitava para obter os 20 000 euros em notas.
Nos dias que se seguiram, o João Ratão seguiu atentamente as notícias (não se falava de outra coisa) e estava sempre a ver quando chegava a vez de o prenderem, mas isso não aconteceu. Finalmente, no dia e na hora combinados compareceu perante o «amigo» no local combinado: numa casa de banho de um centro comercial. O encontro foi rápido: trocaram envelopes e cada um verificou ter recebido o que pretendia. Quando se ia afastar, aliviado, o João Ratão perguntou:
— Bom…É tudo?
— Não — respondeu o «amigo» — falta só mais uma coisa. Vire-se e ponha as mãos atrás das costas. Está preso!