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Distâncias (quase) infinitamente grandes e distâncias (quase) infinitamente pequenas estão intrinsecamente relacionadas no Universo de que fazemos parte e que aos poucos vamos tentando conhecer melhor. Nesta rubrica escreverei algumas palavras, e números (!), sobre o Universo que vemos quando olhamos para um céu estrelado numa noite límpida. Uma modesta contribuição para ajudar a reflectir sobre a nossa posição no contexto cósmico.
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Explica-nos a teoria do Big Bang que houve uma época na história do universo durante a qual a radiação não viajava livremente pelo espaço, sendo constantemente absorvida e reemitida como consequência da sua interação com a matéria (eletrões e núcleos atómicos leves – isótopos de hidrogénio, hélio, lítio e berílio). O universo era um plasma muito quente e opaco à radiação. À medida que o universo foi expandindo, foi consequentemente arrefecendo, de tal modo que a partir de certo instante, quando a temperatura atingiu cerca de 3000 kelvin, os eletrões acoplaram-se aos núcleos existentes, formando átomos. Como resultado, o universo ficou essencialmente transparente à radiação. Esta radiação é designada por radiação cósmica de fundo e corresponde à radiação mais antiga que pode ser observada, tendo origem numa época em que o universo tinha apenas cerca de 378 mil anos de idade, ou seja, cerca de 0,0027% da idade atual (13,8 mil milhões de anos).
A contínua expansão do universo levou ao contínuo arrefecimento desta radiação, tendo a temperatura que lhe corresponde diminuído dos 3000 kelvin da época em que se libertou da matéria, até aos 2.73 kelvin com que é observada hoje em dia. Para onde quer que se olhe no céu, desde que se procure por radiação eletromagnética sob a forma de micro-ondas, lá está a radiação cósmica de fundo, um dos grandes suportes observacionais para a teoria do Big Bang.
O fundo cósmico de radiação de micro-ondas varia pouquíssimo de uma região do céu para outra região do céu. A imagem seguinte, que representa a totalidade do céu, mostra um mapa das diferenças na temperatura da radiação cósmica de fundo em relação ao valor de 2.73 kelvin.
Crédito: ESA and the Planck Collaboration
As variações na radiação cósmica de fundo, com origem no universo primordial, são muito pequenas, da ordem de apenas algumas partes em 100 mil, e ocorrem em diferentes escalas espaciais. Nestas variações ficaram registadas importantes marcas que são consequência das propriedades físicas do universo primordial. Da sua análise resultam determinações precisas da constituição (matéria, matéria escura e energia escura), da taxa de expansão e da idade do universo.
Alguns talvez digam: “Isto é uma imagem que mais se parece com ruído, como aquele que vemos numa televisão fora de sintonia, ligada a uma antena analógica”. Talvez pareça. Mas analisada por quem sabe, utilizando os conhecimentos e técnicas adequados, diz muito acerca do universo e da sua evolução, quer passada quer futura.
P.S.
1 - Um plasma é um gás constituído por cargas elétricas livres, quer negativas e positivas.
2 - A diferença entre as escalas de temperatura kelvin e celsius é apenas um fator aditivo: zero graus celsius correspondem a 273,15 kelvin. Zero kelvin é o zero absoluto de temperatura. Não há temperaturas negativas na escala kelvin.
3 – Informação adicional pode ser encontrada no portal de educação e divulgação da missão Planck (em língua inglesa) ao qual pode aceder aqui.