100 Problemas por José Paulo Viana

Clube de Matemática SPM - Eixos de Opinião dezembro de 2014




 

Ah, os problemas!                         
Lembram-se do prazer que é encontrar um problema, daqueles que nos desafiam logo que o lemos, e depois avançar na resolução até conseguir descobrir a resposta?                         
Recordam-se da alegria que é descobrir a forma elegante e simples que alguém encontrou para resolver um problema que julgámos impossível ou que tanto trabalho nos deu?                         
E, finalmente, concordam que entusiasma discutir com outras pessoas a maneira de chegar à solução de um problema que nos intriga?                         
Pois é por estes três motivos que esta secção existe.

   

José Paulo Viana - Professor de Matemática na Escola Secundária de Vergílio Ferreira, autor da seção "Desafios" aos domingos no jornal Público


100 Problemas por José Paulo Viana

Artigo de dezembro de 2014                          

Clube de Matemática SPM


Título: Comparando Salários



Há muitos anos encontrei na revista Pour la Science, de Maio de 1995, no artigo “Calcular e Votar com Cartas” de Jean-Paul Delahaye, um problema que muito me fascinou.

Duas pessoas querem saber qual delas ganha mais, mas nenhuma quer que a outra, ou qualquer outra pessoa, saiba quanto é que ganha.
Descobrir um processo que permita comparar os salários e ficar a saber quem mais ganha, mantendo secretos os dois salários.


Leitor, antes de prosseguir na leitura, pense um pouco no problema. É que, nos primeiros momentos, não parece nada fácil nem imediato. Claro que, com o tempo e sobretudo se o discutirmos com outras pessoas, acabamos por arranjar. 

Uma vez, tive de me ausentar da escola por uma semana. Entre outros trabalhos, propus aos meus alunos que, nesse intervalo, pensassem no problema e me trouxessem soluções.

A turma era bastante boa. Gostaram do problema, envolveram-se nele e discutiram-no entre si, com os amigos e com as respetivas famílias, trazendo métodos divertidos e engenhosos de o resolver. Vejamos alguns.

Método da Sofia. Ver que automóveis eles têm. Por exemplo, se um tiver um Fiat Uno e outro um BMW, ficamos a saber que ganha mais. Crítica: não é um processo nada fiável.

Método do Ricardo. Cada um traz o seu ordenado em notas novas de 5€ e vê-se quem tem a pilha mais alta. Crítica: falha se os ordenados tiverem valores muito próximos, além de que cada um fica, por comparação, com uma ideia bastante aproximada do salário do outro.

Método da Inês. Criar um programa de computador que peça o salário do primeiro, que é introduzido secretamente e guardado numa variável a, peça o do segundo, também introduzido secretamente e guardado em b, indique o valor lógico (verdadeiro ou falso) da proposição a>b e termine apagando os valores das variáveis. Crítica: funciona perfeitamente e o método pode até ser adaptado a uma calculadora gráfica sem necessidade de escrever o programa.

Método 1 do Filipe. Material necessário: dois hipnotizadores. O primeiro hipnotiza separadamente as duas pessoas, pede que cada um lhe diga o salário e declara publicamente quem mais ganha. O segundo hipnotiza o primeiro e diz-lhe que esqueça o que ouviu. Variante: como é difícil arranjar dois hipnotizadores, usar apenas um que hipnotiza um terceiro elemento que faça as perguntas às duas pessoas, declare qual tem maior salário e depois esqueça tudo. Crítica: o hipnotismo não é uma ciência certa.

Método 2 do Filipe. Material: uma terceira pessoa, um taco de basebol e um edifício alto. Cada um diz a essa pessoa quanto ganha e ela anuncia o vencedor. Com o taco, dá-se-lhe uma tacada forte na cabeça e atira-se a pessoa do alto do edifício. Crítica: levanta muitas questões éticas e policiais.

Método 3 do Filipe. Material: um chimpanzé esfomeado, muitas bananas e duas caixas com aberturas laterais. Cada um coloca na sua caixa um número de bananas correspondente ao que ganha. As caixas são abertas simultaneamente e viradas para o chimpanzé. Este, cheio de fome, escolherá a caixa com mais bananas. Crítica: material difícil de arranjar (sobretudo o chimpanzé) e como as duas caixas terão ambas muitas bananas, nada garante que o animal se dirija à que tem mais.

Método de Jean-Paul Delahaye: é um pouco complicado para ser explicado aqui mas usa apenas um baralho de cartas.

Da discussão de todos estes métodos, cada um com as suas falhas e as suas qualidades, foi possível chegar a um processo bastante eficaz.

Método da areia. Material: areia, duas caixas iguais, uma balança normal, uma balança de pratos. Cada um coloca, na sua caixa, areia com o peso (em gramas) igual ao salário (em euros). Comparam-se as caixas na balança de pratos para ver qual é mais pesada.


Publicado/editado: 17/12/2014