À Distância por Daniel Folha

 


 


Distâncias (quase) infinitamente grandes e distâncias (quase) infinitamente pequenas estão intrinsecamente relacionadas no Universo de que fazemos parte e que aos poucos vamos tentando conhecer melhor. Nesta rubrica escreverei algumas palavras, e números (!), sobre o Universo que vemos quando olhamos para um céu estrelado numa noite límpida. Uma modesta contribuição para ajudar a reflectir sobre a nossa posição no contexto cósmico.


Daniel F. M. Folha - Professor Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Saúde – Norte (ISCS-N), Coordenador de Projectos e Protocolos do CIENCEDUC – Educação para as Ciências (Departamento de Ciências do ISCS-N), Investigador do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP)
 


TÍTULO: AINDA NAVEGAMOS PELAS ESTRELAS


Durante as férias muitos terão escolhido viajar por terras e caminhos por eles desconhecidos, tarefa actualmente facilitada pela utilização de equipamentos que nos guiam pelas estradas através do acesso ao sistema GPS (Global Positioning System). Este sistema é constituído por uma constelação de cerca de três dezenas de satélites artificiais em órbita da Terra, por estações de controlo na superfície, e por aparelhos capazes de calcular a latitude, longitude e altitude do local onde se encontram com base em informação recebida dos satélites. Sistemas de posicionamento global têm grande importância económica e estratégica: para além do GPS dos Estados Unidos da América, a Rússia possui o seu próprio sistema, o GLONASS, os países europeus estão a implementar o GALILEO, enquanto China e Índia têm projectos para o desenvolvimento e implementação dos seus sistemas.


Recuemos alguns anos, até um tempo em que não existia GPS. Munidos de mapas construídos com rigor, e talvez com uma bússola, podíamos viajar por terra com maior ou menor dificuldade. Mas viagens marítimas sem costa à vista implicava navegar pelas estrelas, ou seja utilizar a posição das estrelas no céu nocturno, ou a posição do sol durante o dia, conjuntamente com informação de tempo, tipicamente dada por um cronómetro, para determinar a posição do observador à superfície da Terra. A possibilidade de utilizar as estrelas para navegar pressupõe o conhecimento detalhado da posição das estrelas no céu, bem como a compreensão dos seus movimentos aparentes, especialmente aqueles que se devem à rotação e translação do nosso planeta.


Hoje em dia é comum dizer-se que a navegação pelas estrelas é obsoleta, completamente ultrapassada pela navegação por GPS. Seria compreensível, não fosse um detalhe aparentemente menor. Um receptor de GPS só cumpre a sua função se receber informação simultânea de alguns satélites da constelação GPS, e estes só conseguem fazer chegar a sua informação à superfície terrestre se estiverem correctamente orientados. Todos os satélites possuem um conjunto de equipamento que lhes permitem determinar com precisão a sua orientação no espaço, por exemplo através da observação contínua do sol ou de estrelas longínquas. Os satélites da constelação GPS utilizam observações do sol. É caso para dizer que afinal, ainda navegamos pelas estrelas...


Publicado/editado: 13/09/2011