Contos de 3º Grau por Inês Guimarães- 4º Episódio - 5ª Parte - A Circularidade do Infinito

Contos de 3º Grau

4º Episódio - A Circularidade do Infinito

 Dia 2 - Gonçalo Gouveia

Não é requerido um infinito exercício de imaginação para adivinhar, dado o epíteto, que o calvário de Infinito Algoritmo remontava ao jardim-de-infância. O seu pai, João Algoritmo, ilustre catedrático de matemática, não primava em espírito prático ou psicologia infantil e estava plenamente convencido de estar a orientar o seu rebento para uma brilhante, senão genial, carreira em matemática, com esta dádiva onomástica. Mas, nem Infinito escapou à chacota constante dos colegas de escola, nem o sobrenome Algoritmo saiu ilustrado: Infinito era, e permaneceu durante sessenta e seis anos e seis meses, finito nas artes matemáticas. Era um professor de matemática competente e dedicado ao infinito, mas falhara ostensivamente o prémio Nobel. Mas tudo isto, neste primeiro dia do ano, ia acabar! Infinito Algoritmo ultimava a derradeira lição, antes da aposentação. E seria épica: Ia demonstrar, ao vivo, o Algoritmo da Circularidade do Infinito! Único senão, nesse mesmo momento a esposa ligava a um psiquiatra.

 Dia 7 - Adília Gomes

Na noite anterior, rebolou, circulou, sonhou de forma insistente como que recordando onde tinha iniciado esta "loucura" de querer demonstrar a circularidade do infinito. Este sonho fê-lo regressar aos melhores momentos de infância, com 5 anos de idade apenas. Muito antes de sofrer bullying na escola por causa do seu nome, do sobrenome e da sua inteligência acima dos outros alunos. Os seus colegas lambuzando-se na sua inveja adquirida dos pais desprovidos de inteligência fizeram-lhe a vida negra. 

Foram largos minutos de sonho feliz da sua infância. Estava em casa a jogar ao pião, este rodava, rodava e, aquilo fazia-lhe muita confusão, principalmente quando este parava. Em seguida, recordou seu arco quando corria sózinho pela rua abaixo, até que algum objeto se colocasse à frente. A verdade é que o arco rodava, rodava...

Nisto, toca o despertador, que o acordou do melhor sonho que tinha tido até esta idade. Voltar a ser uma criança feliz foi uma realidade virtual. Era o dia da demonstração... antes tinha de se livrar do psiquiatra! 

 Dia 12 - Francisco Fernandes

Iniciou o dia, como todos os outros ao longo destes últimos 44 anos, 4 meses e 4 dias, sempre que tinha aulas.
Um duche com água nem muito quente, nem muito fria, seguido da restante higiene pessoal, tudo efetuado num ritual preciso e cronometrado, ocupando-lhe 28 minutos, mais precisamente 14 minutos a tomar banho e 7 a secar-se; 4 minutos a fazer a barba 1 a pentear-se, 2 a lavar os dentes.
A roupa era fácil de escolher. Como detestava perder tempo, no seu guarda-fatos, tinha o mesmo modelo de fato, com vários exemplares, todos da mesma cor. A camisa sempre branca e sapatos pretos.
O pequeno almoço era tomado na mesa de refeições, mesa essa circular, mesa-redonda, como gostava de lhe chamar.
Um café com leite, com dois cubos de açúcar, mexendo 3 vezes a colher, sem no sentido dos ponteiros do relógio, iniciando o movimento como se o ponteiro indicasse as 6 horas.
Uma torrada com manteiga acompanhva este café com leite, barrada de forma circular.
Este meticuloso ritual permitia-lhe não ocupar a cabeça com nada mais do que o Algoritmo da Circularidade do Infinito.
Contudo, hoje algo lhe escapava do controlo. O psiquiatra...

 Dia 17 - Carlos Marinho

O psiquiatra esperava. Tic Tac...Tic Tac. Ir ao psiquiatra era como uma desonra. Como podiam pensar que ele estava com problemas psiquicos, quando estava prestes a descobrir algo de importante para a sociedade em geral. Cambada de invejosos. Conjunto de imbecis. Pensava nisto, porque toda a sua vida desde criança tinha sido invejada por uma cambada de delinquentes intelectuais, que depois muitos deles derivaram em políticos ignorantres. mas como colavam bem cartazes, subiram na vida em flecha.

Algoritmo só pensava no conhecimento, na pesquisa, no estudo, no avanço. Até a mulher o estava a chatear. Será que estou mesmo doente? Pensava ele para os seus botões. Decidiu ir. Enfrentá-lo. Se possível fazer com que este psiquiatra fosse, ele próprio ao psiquiatra com as respostas que lhe ia dar. É isso! Vou fazer com que o meu psiquiatra vá ele próprio ao psiquiatra. Seria giro.

Nisto, bate à porta. Entre! Abriu a porta e quem estava sentado na secretária. O psiquiatra. Sim! Era só o seu maior amigo de infância, o Jonas Quadrado, que passou milhares de horas a jogar com ele ao pião e ao arco.

  Dia 25 - Inês Guimarães

- Algoritmo! Meu caro, já não te via há uma infinidade de tempo! – exclamou Quadrado.
- É pena o reencontro ser neste... contexto... A minha mulher é tramada, pá – queixou-se Infinito.
- Ninguém te mandou engatar uma tira de Möbius... Quando metem uma coisa na cabeça, não dá para desviar o pensamento delas noutra direção. Mas vá, explica-me lá que demonstração é esta que andas a tentar fazer.
- É o Algoritmo da Circularidade do Infinito. E não ando a tentar. Eu sei prová-lo e vou prová-lo – disse o paciente em tom assertivo.
- Ó c’um caraças, pá... Fazes-me lembrar os cães que rodopiam sobre si próprios vezes sem conta para tentar morder a cauda. Quanto mais giram, mais desnorteados ficam – respondeu o médico.
- Vai-te lixar. Antes cão que psiquiatra.
- Ei, olha a linguagem! Já não somos dois putos, somos adultos, por isso, age como tal. 
Algoritmo limitou-se a encolher os ombros. Jonas continuou:
- Deixaste-me com vontade de te mandar ir dar uma volta, mas, como bom profissional que sou, vou ouvir tudo o que tens para me dizer.

 Dia 30 - José Veiga de Faria

Fim do Episódio

Publicado/editado: 26/01/2020