Intersecções por Daniela Gonçalves - (novos) Ventos... (novos) Cenários... (novos) Ambientes de aprendizagem

Eixos de Opinião de julho de 2018

Título: (novos) Ventos... (novos) Cenários... (novos) Ambientes de aprendizagem

Novos ventos chegaram (e isto não é de hoje) ao campo educativo e um dos papéis da educação é exatamente o de situar o ser humano no seu tempo, nos seus problemas e necessidades. Por essa razão, a Escola não deve estar de costas voltadas para a sociedade. É neste quadro, que se verifica um consenso generalizado entre os atores endógenos da escola de que os meios que ela dispõe são insuficientes, sendo insatisfatória a adequação da sua resposta às necessidades sociais e pessoais dos alunos.

A Escola deve compreender o aluno como pessoa, numa busca de equilíbrio entre conhecimento, autonomia e responsabilidade social, isto é, toma como quadro de referência o aluno, na busca incessante do seu aperfeiçoamento integral e recorre a uma estrutura pluridimensional, cujas dimensões específicas potenciam nos educandos capacidades particulares. 

O excesso de informação, as formas emergentes de comunicação e a interação interpessoal, a interpelação pelos meios de comunicação social, as novas versões de entretenimento, entre tantas outras experiências deste “admirável mundo novo”, estão a mudar a maneira de ser dos alunos e dos professores, baralhando o que achávamos certo, verdadeiro e lógico. As nossas identidades tornaram-se deslizantes, múltiplas, escorregadias e podemos adquirir muitas facetas. Os efeitos das tecnologias, porém, não são lineares, eles são eivados de ambiguidades e de paradoxos. Os alunos do século XXI, que dominam as tecnologias melhor do que alguns professores, que iniciam precocemente as suas experiências “tecnológicas” e que fazem quase tudo sozinhas, por vezes não querem crescer. Em outros tempos, sonhávamos em ser adultos, em usar sapatos de salto alto; hoje, parece que ninguém quer crescer e envelhecer. Quais as consequências deste “acontecimento”? Este apagamento de fronteiras e a essa quase fusão dos universos adulto e infantil, crianças e jovens distanciam-se dos adultos (e vice-versa) em virtude de outro elemento muito importante: as configurações do trabalho no novo capitalismo. O tal trabalho “flexível” do novo capitalismo, organizado em projetos, execuções a curto prazo e grande mobilidade, tem transformado trabalhadores de qualquer nível em reféns. Além disso, os novos contratos de trabalho com duração fixa deixam todos à mercê de tensas expectativas, além de inviabilizar, cada vez mais, grupos estáveis de amigos e relacionamentos com a família. De facto, as pessoas estão a perder o controlo sobre o planeamento e a organização das suas vidas, bem como a possibilidade de projetar o seu futuro. Esta impossibilidade de construir uma narrativa coerente para a própria vida, escrever a sua própria biografia, acaba por corroer a personalidade. Enquanto os pais permanecem ocupados com as decisões cruciais sobre a viabilidade financeira da família, crianças e jovens preenchem o tempo sozinhas, com atividades passageiras, circunstanciais, superficiais, quase sempre privados da participação daqueles que poderiam ajudá-los a desenvolver virtudes estáveis como lealdade, persistência, confiança e ajuda mútua. Mas os paradoxos persistem. Muitos pais e mães declaram-se exaustos e incapazes de corresponder às intermináveis exigências feitas pela Escola em relação à participação dos pais nas atividades que envolvem a educação dos filhos. Parece, então, que esta deixou de ser hoje uma simples questão de opção. Estamos todos a ser governados pelas culturas em que estamos inscritos. Pais e filhos são impelidos para tarefas, atividades e decisões em relação às quais não há possibilidade de escolha.

Há, pois, uma outra gramática cultural em andamento. Quem duvidar disto precisa de olhar para fora do seu universo restrito e tentar descortinar o que vê. Compreender já é outra conversa.

O cenário mudou. A cultura do espetáculo, da imagem e das visibilidades, invade as Escolas, alterando as suas rotinas e práticas. Esta cultura é hoje o nosso próprio “ambiente”. É nela que a humanidade se vai reconfigurando e é nela e com ela que precisamos de aprender a viver. E esta não é uma tarefa exclusiva da Escola, é uma tarefa de todos e de cada um. Não é necessário “defendermo-nos” desta cultura; o nosso desafio é penetrá-la e compreendê-la. Não devemos temer tudo aquilo que nos escapa; fugir não é solução. Talvez, inventar outros caminhos, criar espaços de esperança que tornem possível um mundo melhor.

Publicado/editado: 08/07/2018