N(eur)ónios por Tiago Fleming Outeiro - Queremos ser deserto ou oásis: o futuro decide-se hoje

Eixos de Opinião de Julho de 2022

Tiago Fleming Outeiro - Director of Department of Experimental Neurodegeneration Center for Nanoscale Microscopy and Molecular Physiology of the Brain - University Medical Center Goettingen (Ver +)


Título: Queremos ser deserto ou oásis: o futuro decide-se hoje

Estamos novamente no Verão, e o flagelo dos incêndios volta a devastar a nossa floresta, devastando a vida de pessoas e animais por todo o país. Sendo algo que se repete anualmente já há vários anos, surpreende que não sejamos capazes de fazer mais e melhor. Infelizmente, não temos tido a capacidade de dar melhores ferramentas de trabalho aos heróis destas lutas, os bombeiros e operacionais que se desdobram até à exaustão para combater os fogos e proteger quem está ameaçado. Ouvimos falar de equipamentos que não funcionam, aviões em mau estado, drones que não são usados, incendiários que não são punidos como deveriam... é tudo triste...

Mas este é apenas uma face do problema, algo mais grave e profundo que nos assola – a escassez de água que vai desertificando os solos e que, como muitos cientistas preveem, possa vir a tornar zonas de Portugal e Espanha em desertos.

Dirão os negacionistas que isto não é verdade, que não é fruto do aquecimento global, que são ciclos que se repetem, e tantas outras balelas que por aí circulam. Mas a evidência científica está à vista para quem quiser ver e estar bem informado. Contra factos não deveria haver argumentos, mas há muitas mentes “criativas” por esse mundo fora...

A nível internacional, assistimos à devastação da Amazónia e outros ecossistemas preciosos, a fenómenos meteorológicos que deixam rastos de destruição, a guerras inúteis que semeiam o ódio entre países vizinhos... não sabemos antecipar os problemas dos comportamentos e hábitos que teimamos em manter.

Num tempo em que tanto se tem falado dos oceanos, e em que se apregoa a vastidão do mar que nos levou a outros nunca dantes navegados, seria importante tomar decisões que nos podem lançar para um futuro melhor. O tema que quero lançar aqui, e sobre o qual já tenho falado publicamente, é a dessalinização da água do mar por osmose reversa. É um processo ainda caro, é verdade, mas sem água não há vida nem prosperidade. A água é um bem cada vez mais escasso e valioso e, se nada fizermos, chegará o dia em que o seu preço será mais alto do que o do petróleo. Ignorar esta realidade é não apenas falta de visão, mas também irresponsabilidade. Por isso penso que está na altura de apostarmos nesta área. 

Olhemos para o exemplo de Israel. Tem uma costa muito inferior à nossa, tinha tremendos problemas de falta de água, e é um exemplo na agricultura e tecnologia. Israel tem apostado, há muitos anos, em centrais de dessalinização que, em 2023, devem já assegurar 90% das necessidades industriais e municipais de água. Isto demonstra que é possível, e que esta é uma aposta que devemos fazer. Numa altura em que as reservas hídricas se apresentam cada vez mais baixas, em que o calor aperta e os fogos destroem a floresta, precisamos de fazer alguma coisa e planear o futuro. Temos costa, temos mar, temos competência científica. Precisamos de coragem política e de visão.

Quando olho para o aspecto de uma central de dessalinização de água, não posso deixar de notar as semelhanças com as refinarias de petróleo. E aqui vejo uma oportunidade, por exemplo em Matosinhos, onde a Petrogal decidiu, recentemente, terminar as suas actividades. Fica aqui uma sugestão para o município, e para o governo – decidir hoje para que possamos ser um Oásis amanhã. 

 

Publicado/editado: 22/07/2022