Quadrantes por Francisco Fernandes - Rainha Santa Isabel e o Milagre das Rosas. Milagre seu ou herança familiar?

Eixos de Opinião de maio de 2018

Título: Rainha Santa Isabel e o Milagre das Rosas. Milagre seu ou herança familiar?

Agora que o mês de maio caminha para o seu fim, um mês que em Portugal está associado ao culto mariano de Fátima, resolvemos relembrar um dos episódios mais conhecidos da nossa história, protagonizado pela rainha Santa Isabel.

D. Isabel, nascida em 1270, era filha do rei D. Pedro III de Aragão. O seu casamento com o nosso rei D. Dinis foi acordado em 1281, tendo Isabel pouco mais de 10 anos de idade, tendo o casamento sido celebrado em 1288.

D. Isabel tinha 17 anos e D. Dinis 26, num casamento celebrado em Barcelona por procuração, tendo depois a agora rainha deslocado-se até Trancoso, onde o rei a aguardava, para realizarem a boda real.

D. Isabel desempenhou um papel bastante ativo na política portuguesa, tendo tido intervenções decisivas em vários acontecimentos como conciliadora, evitando guerras, conflitos, como aqueles que opuseram o rei D. Dinis e o príncipe herdeiro, futuro D. Afonso IV, numa guerra civil que vitimava bastantes pessoas no país, ou então como mediadora no Tratado de Alcanizes, assinado em 1297 entre D. Dinis e D. Sancho IV de Castela, tratado que garantiu a paz e fixou as fronteiras entre os dois países, transformando Portugal no país europeu com as fronteiras mais antigas.

Além deste papel político ativo, a rainha D. Isabel ficou também conhecida pela sua extrema bondade e dedicação às obras de caridade, ganhando fama de santa ainda em vida.

Foi ela que doou farinha para combater a grande fome que se sentia em Coimbra em 1293, frequentemente distribuía esmolas pelos pobres, pagava dotes de raparigas sem dinheiro e pagava mesmo a educação de fidalgos pobres, sendo ela fundadora de vários hospitais como Coimbra, Santarém e Leiria e patrocinadora de inúmeras obras religiosas.

Após a morte de D. Dinis, ingressou na ordem feminina de freiras clarissas, recolhendo-se no convento de Santa Clara de Coimbra, tendo após a sua morte em 1336, sido canonizada em 1625 pelo papa Urbano VIII.

O seu milagre mais conhecido é o denominado “milagre das rosas”, segundo o qual conta a lenda de que o rei irritado com a rainha por andar a distribuir dinheiro pelos pobres, proibiu-a de dar mais esmolas. Apesar desta proibição, a rainha continuava a ajudar os mais carenciados, levando às escondidas pão ou dinheiro no seu manto. Até que um dia, o rei confronta a rainha e pergunta-lhe o que leva no manto e ela responde-lhe “são rosas, senhor!”. O rei desconfiado pois estava-se no mês de janeiro, pede à rainha que abra o manto e do seu regaço caem as rosas mais belas que alguma vez havia visto. Mas terá esta lenda alguma veracidade?

A primeira referência a este episódio é uma pintura realizado num retábulo do século XIV, conservado no Museu Nacional de Arte da Catalunha. Foi passado para o papel por Frei Marcos de Lisboa, na Crónica dos Frades Menores, em 1562, atribuindo este e outros milagres à rainha.

Contudo, este milagre da nossa rainha não é original na Europa de final da Idade Média. Ele é semelhante a um atribuído à sua tia-avó Santa Isabel da Hungria, que anos antes da nossa Santa Isabel, já havia realizado um milagre de rosas em tudo semelhante.

Aliás, a família de D. Isabel que reinou em Portugal é mesmo uma família abençoada, pois além de ser sobrinha-neta de Santa Isabel da Hungria, foi tia das santas Cunegundes e Margarida da Hungria, prima de Santa Inês de Praga e a sua tia-avó já era sobrinha de Santa Edviges.

Fora do círculo familiar de D. Isabel, existem também outras santas que realizaram milagres idênticos, como a castelhana Santa Cacilda e a italiana Santa Zita, cujas vidas são anteriores à da nossa rainha santa, e também elas transformaram oferendas aos pobres em rosas.

Este factos em nada alteram a vida devota e a bondade da nossa rainha santa, bem como a sua devoção religiosa, vida que foi depois recompensada com a sua beatificação e canonização.

O que nos fica da lenda é uma prática bastante comum nesta europa medieval, marcada por uma forte religiosidade, com lendas orais que atravessavam todo o continente, tal como a lenda do galo de Barcelos. 

Mas essa fica para uma próxima oportunidade.

Publicado/editado: 28/05/2018