(U)Ma Temática Elementar por José Carlos Santos - O impossível

Eixos de Opinião de Fevereiro de 2019

Título: O impossível

Certos problemas ocuparam os matemáticos durante muito tempo até que se provou que eram impossíveis de resolver. O mais famoso destes problemas é, talvez, o da quadratura do círculo: como construir, usando somente régua e compasso, um quadrado com a mesma área que a de um círculo dado.
 
Mas como é que se pode provar que um problema deste tipo não tem solução? Não será arrogância da nossa parte acreditarmos que nunca aparecerá um dia alguém tão esperto que acabará por o resulver? Não, não é, pois estes (e muitos outros problemas impossíveis) têm uma característica em comum: é que não se trata apenas do problema de fazer uma coisa. O problema consiste também em fazê-lo segundo certas regras bem definidas. E isso faz toda a diferença.
 
Considermos o seguinte desafio. Uma pessoa tem à sua disposição quatro folhas de papel. E pode fazer duas coisas com elas:
 
Pode pegar em três folhas e rasgar cada uma em duas.
Pode pegar em duas folhas e rasgar cada uma em quatro bocados.
 
E pode fazer isto as vezes que quiser, sem haver qualquer restrição quanto à decisão de como aplicar as duas regras. Pode só aplicar a primeira, só aplicar a segunda, aplicar a primeira e, depois disso, aplicar somente a segunda, etc. É como quiser.
 
E pode parar quando quiser. Uma coisa é certa. Quando parar, não terá 200 bocados de papel à sua frente. Pode ter mais e pode ter menos, mas nunca terá, em caso algum, exactamente 200 bocados. E porquê? Porque, de cada vez que aplica a primeira regra, está a retirar três bocados de papel da mesa e a pôr lá seis. E, de cada vez que aplica a segunda regra, está a tirar dois bocados de papel da mesa e a colocar lá oito. Em ambos os casos, o número de bocados de papel aumenta por um múltiplo de três (três novos bocados se aplicar a primeira regra e seis se aplicar a segunda). Mas essa pessoa começou com quatro bocados e, portanto, o número final terá que ser igual a quatro mais um múltiplo de três. Mas 200 – 4 = 196, que não é múltiplo de três.
 
Isto pode parecer tão básico que nem merece ser mencionado. Mas é exactamente o mesmo princípio que é usado no problema impossível mencionado no início deste texto (e em muitos outros): é possível encontrar uma propriedade que é preservada pelas operações envolvidas e é exactamente essa preservação que é empregue para demonstrar que o problema não tem solução.
Publicado/editado: 21/02/2019