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Ah, os problemas!
José Paulo Viana - Professor de Matemática na Escola Secundária de Vergílio Ferreira, autor da seção "Desafios" aos domingos no jornal Público |
As afirmações auto referentes, isto é, que fazem referência ao seu próprio conteúdo, podem dar origem a situações paradoxais e têm intrigado a humanidade pelo menos desde a antiguidade clássica.
Um dos exemplos mais famosos é o da afirmação feita por Epiménides, um filósofo e poeta grego da ilha de Creta que viveu há 2500 anos. Afirmou ele: “Todos os cretenses são mentirosos”.
A frase é verdadeira ou é falsa? Ou é as duas coisas? Ou será “impossível”?
Se a frase for verdadeira, não há dúvida: todos os cretenses são mentirosos, logo ele também é portanto não pode estar a dizer uma verdade. Contradição.
E se a frase for falsa? Se é falsa, Epiménides está a mentir e portanto os cretenses falam verdade. Mas se falam verdade, Epiménides, que é cretense, já não pode estar a mentir. Nova contradição? Não! Se a frase é falsa, é mentira que “todos os cretenses são mentirosos”. Ora o contrário de “todos mentirosos” não é “todos verdadeiros”. Para que a frase “todos os cretenses são mentirosos” seja falsa basta que nem todos mintam. Ou seja, o contrário de “todos os cretenses são mentirosos” é “existe pelo menos um cretense que fala verdade”. Então, não há qualquer contradição na frase de Epiménides. Ficamos a saber que alguns cretenses são verdadeiros, que outros são mentirosos e que Epiménides é um mentiroso.
Este tipo de situações auto referentes dá origem a alguns problemas interessante e que exercem uma atração especial em certas pessoas (o autor incluído).
Vejamos o exemplo deste cartão.
Contamos os algarismos e vemos que há 12 entre zero e quatro e 4 entre cinco e nove. Mas ao escrever “12” e “4” nos espaços, alteramos o número de algarismos (passam a ser 19 em vez dos 16 iniciais) e as frases ficam falsas. Temos de, por tentativas, reiniciar as contagens, tendo em conta o que escrevermos nos espaços. Penso que os leitores não terão dificuldade em chegar à solução.
O matemático norte-americano Robinson descobriu um algoritmo que permite encontrar uma solução neste tipo de problemas auto refrentes, caso eles sejam possíveis. O método é muito simples. Parte-se do que já está escrito e vão fazendo-se aproximações sucessivas até o processo estabilizar. Apliquemo-lo ao problema anterior.
A situação inicial é escrever 12 e 4.
No passo seguinte, atualizamos os valores, entrando em linha de conta com estes três novos algarismos. Obtemos 15 e 4.
Atualizando de novo, ficará 14 e 5.
Fazendo outra vez, vem novamente 14 e 5. Como é igual ao anterior, já não pode haver mais alterações e esta é uma solução.
Este método permite encontrar uma solução (caso exista) mas não garante que ela é única.
(Adaptado de um capítulo do livro Uma Vida Sem Problemas, José Paulo Viana, Ed. Clube do Autor, 2012)
Artigo de Opinião
"100 Problemas" por José Paulo Viana de setembro de 2013. Título: "Quando as aparências atrapalham"
"100 Problemas" por José Paulo Viana de maio de 2013. Título: ""
"100 Problemas" por José Paulo Viana de janeiro de 2013. Título: "Como Tudo Começou (Comigo)"
"100 Problemas" por José Paulo Viana de dezembro de 2012. Título: "Um Cêntimo para os Pobres""100 Problemas" por José Paulo Viana de novembro de 2012. Título: "Se é difícil, comecemos pelo fácil"
"100 Problemas" por José Paulo Viana de outubro de 2012. Título: "Quando as mentiras são o Problema"