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José Carlos Santos - Departamento de Matemática da FCUP Dia 21 de cada mês
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Título: Série harmónica
Em Matemática estudam-se séries, ou seja, somas com uma infinidade de parcelas. Uma das séries mais famosas é a série harmónica, ou seja, a série
A pergunta natural a fazer sobre esta série é se converge ou não para algum número. Por outras palavras, será que os números 1, 1 + 1/2, 1 + 1/2 + 1/3, … se estão a aproximar de algum número? Ou será que, pelo contrário, as somas daquele tipo podem tomar valores tão grandes quanto se queira? É esta segunda possibilidade que tem lugar. Uma demonstração simples e engenhosa deste facto foi publicada em 1650 por Pietro Mengoli, que começa por observar que, dados três números naturais consecutivos, n – 1, n e n + 1, se tem
Com efeito, isto é o mesmo que afirmar que 1/(n – 1) + 1/(n + 1) > 2/n e esta última desigualdade resulta de se ter 1/(n – 1) + 1/(n + 1) = 2n/(n2 – 1) > 2n/n2 = 2/n.
Como é que Mengoli aplicou este facto? Ele observou que resulta dele que 1/2 + 1/3 + 1/4 > 3/3 = 1. Em seguida, considere-se a soma dos nove termos seguintes da série:
Aplicando a desigualdade anterior a cada grupo de três termos desta soma, concluímos que é maior que
E pode-se prosseguir da mesma maneira: a soma dos vinte e sete termos seguinte é maior do que 1, a soma dos oitenta e um termos seguintes é maior do que 1, e assim por diante. É por isso que a série harmónica pode tomar valores tão elevados quanto se queira.
Hoje em dia, a demonstração que se costuma fazer desta propriedade da série harmónica é a seguinte:
e assim por diante. Ou seja, estamos a adicionar números maiores do que 1/2 e, portanto, estas somas podem tomar valores tão grandes quanto se queira. Esta demonstração é de Nicole Oresme e é cerca de 300 anos mais antiga que a de Mengoli.
Demonstrações da divergência da série harmónica não faltam. Para terminar este texto, vejamos uma do século passado, da autoria de Leonard Gillman. Ele observou que se se pudessem somar os números 1 + 1/2 + 1/3 + 1/4 + 1/5 + … e que se S fosse a sua soma, então, uma vez que 1 > 1/2, que 1/3 > 1/4 e assim por diante, se teria
Como se chegou à conclusão de que S > S, há aqui algum erro, que é o de supor que a série harmónica tem uma soma finita.