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Distâncias (quase) infinitamente grandes e distâncias (quase) infinitamente pequenas estão intrinsecamente relacionadas no Universo de que fazemos parte e que aos poucos vamos tentando conhecer melhor. Nesta rubrica escreverei algumas palavras, e números (!), sobre o Universo que vemos quando olhamos para um céu estrelado numa noite límpida. Uma modesta contribuição para ajudar a reflectir sobre a nossa posição no contexto cósmico.
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O Sol, como a maior parte das outras estrelas, é uma gigantesca bola de gás constituída essencialmente por hidrogénio e hélio, aos quais se juntam uns pozinhos de elementos mais pesados. A energia produzida bem no interior do Sol é transportada até à superfície, primeiro por radiação, ou seja através da propagação de fotões (radiação eletromagnética), e nas camadas exteriores por convecção, isto é através de movimentos macroscópicos de gás análogos aos que ocorrem com água a ferver numa panela ao lume. Esta zona convectiva ocupa a região do Sol situada entre aproximadamente 0,7 raios solares e 1 raio solar.
Como resultado da convecção, no interior do Sol formam-se ondas acústicas (ondas de pressão) que põe o Sol literalmente a vibrar. Estas vibrações, ou oscilações como geralmente são designadas, ocorrem em milhares de frequências diferentes, e manifestam-se à superfície do Sol como movimentos periódicos identificáveis através do efeito Doppler.
A “música” produzida pelo Sol é, assim, constituída por milhares de notas musicais, que contudo se situam fora dos limites de audição humana. As frequências de maior intensidade identificadas no Sol situam-se na região dos 2 a 4 mHz (2 a 4 milésimos de ciclos por segundo), ou seja ocorrem a frequências 10 mil vezes inferiores às menores frequências audíveis para a espécie humana (cerca de 20 Hz). Multiplicando as frequências de oscilação do Sol por um fator apropriado é possível transformá-las em frequências audíveis, e assim “ouvir” a “música” do Sol. Convido o leitor a “ouvir” esta “música” aqui.
O espectro de frequências das oscilações (frequências produzidas e respetivas intensidades) contém informação acerca das regiões por onde as ondas acústicas se propagam, ou seja o interior do Sol. Através da observação das oscilações, da sua caracterização, da utilização das leis da física e de técnicas matemáticas apropriadas, é possível obter informação acerca do interior solar e da sua estrutura. Esta metodologia é semelhante à que se utiliza para estudar o interior da Terra através das ondas sísmicas, e por isso os estudos do Sol realizados deste modo inserem-se numa área batizada de sismologia solar ou héliossismologia.
Mais recentemente, através da identificação de pequeníssimas alterações periódicas no brilho de outras estrelas, tem sido possível alargar o estudo das oscilações de tipo solar a outras estrelas, permitindo assim estudar os seus interiores, de outro modo inacessíveis aos olhos humanos.
P.S. É impossível ouvirmos na Terra sons provenientes do Sol uma vez que entre nós e a nossa estrela o espaço é de quase vácuo, e em vácuo o som obviamente não se propaga. Uma aparente, mas inexistente, propagação de som no vácuo do espaço é utilizada na generalidade dos filmes e séries de ficção científica quando incluem extraordinárias batalhas espaciais cheias de ricas sonoridades provenientes de motores, armas a disparar e explosões diversas!