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Este espaço vai ser dedicado a aspectos simples da vida em contexto real, em que a matemática pode entrar como elemento surpresa. Em síntese, estas "linhas" terão como base "pontos" comuns da nossa vida, em que a objectividade da Matemática pode fazer compreender alguns "problemas" que vão surgindo em contexto real. Como afirmou Pitágoras, "Todas as coisas são números". Nesta rubrica tudo cabe... até a matemática.
Carlos Marinho - Coordenador do Clube da Matemática da Sociedade Portuguesa de Matemática
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Para decidir a quem deveria pertencer uma cidade que aparentemente estaria na fronteira dos dois países, os reis da Suécia e da Noruega decidiram jogá-la literalmente aos dados. Decidiram utilizar a sorte dos dados, “alea jacta est”. Utilizaram dois dados regulares e quem tirasse a maior soma num movimento ganharia esse território. O rei da Suécia foi o primeiro a lançá-los e tirou o máximo de pontos possíveis, um duplo seis, 12 no total. Aparentemente, parecia que tudo estava decidido, pois seria muito difícil ao rei da Noruega repetir essa proeza. Afinal a probabilidade de repetir a proeza do seu adversário “real” era de um caso favorável contra trinta e seis possíveis. Mesmo assim, com as probabilidades contra si, jogou. E jogou bem. Os deuses estavam do lado do rei da Noruega. Lançou os dados e tirou também um duplo seis. Restava repetir a competição, uma espécie de prolongamento. Era novamente a vez do rei da Suécia lançar. Ninguém acreditaria que ele voltaria a repetir o feito de tirar o duplo seis. Mas tirou e, a sorte da cidade parecia estar traçada. O rei da Noruega segura então nos dados, com determinação lança-os e, para espanto de todos, um dos dados partiu-se, mostrando um três e um quatro. O outro dado, o segundo, saiu um seis. No total, obteve treze pontos.
Recentemente o chefe de estado português esteve na Suécia e, posteriormente na Dinamarca (um país nórdico que não a Noruega) com o objetivo de promover a nossa economia. O último ato oficial na Suécia de Cavaco Silva foi em Malmoe. De seguida, dirigiu-se para a Dinamarca, para Copenhaga. A distância percorrida foi de escassos quilómetros. É verdade, estas duas cidades da Suécia e Dinamarca estão separadas por pouco mais de uns quantos quilómetros, ligadas através de uma ponte especial. Parece impossível. Trata-se de um complexo e ciclópico rodoferroviário constituída por uma ponte e um túnel submarino, cujo termo técnico é chamado de Ligação de Oresund. A ponte tem uma das mais longas linhas de cabos e fios do mundo com 490 metros. A altura do pilar é o mais elevado, com 204 metros. O comprimento total da ponte é de 7845 metros, aproximadamente metade da distância entre as terras dinamarquesas e suecas, e imagine-se tem um peso de 82 mil toneladas.
A construção deste bólide de engenharia começou em 1995. Muita matemática esteve envolvida nesta obra. A inauguração oficial foi em 1 de junho 2000, com as presenças da rainha Margarida II da Dinamarca e do rei Carlos XVI Gustavo da Suécia. Uma obra real extraordinária que não é uma lenda. O Presidente da República visitou e atravessou esta obra. A probabilidade de um português fazer o mesmo, passar e visitar travessia, é definido como um acontecimento pouco provável, devido aos problemas financeiros que a maioria dos portugueses atravessam.
Apesar de tudo, ficamos todos a aguardar pelos resultados desta visita presidencial. Que ponte estabeleceu Cavaco Silva nesta visita? Que tipo de dados terá usado? Conseguirá Cavaco Silva rachar um dado de forma a obter 13 pontos no lançamento das propostas que apresentou? Que probabilidades terá de ser bem sucedido? Terá levado nesta comitiva algum matemático?
Esperemos que esta visita não se transforme numa lenda nórdica...e possa significar algo de novo para Portugal. Já Fernando Pessoa dizia que “há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.