Em 1958, Donald Knuth --- um dos maiores especialistas mundiais em Ciência de Computadores e criador do TeX --- era um dos gestores da equipa de basquetebol da universidade onde então estudava. Pensando em maneiras de melhorar os resultados da sua equipa, Knuth elaborou um sistema de classificação do desempenho de cada jogador, tomando em conta diversas estatísticas recolhidas ao longo de um jogo. Essas classificações eram depois usadas pelo treinador para tentar melhorar o desempenho da equipa e para ajudar a conceber estratégias que aproveitassem melhor cada jogador.
A IBM fez na altura uma pequena reportagem publicitária, intitulada "O Treinador Electrónico", que pode agora ser vista no YouTube, neste link, e onde é afirmado que na época anterior à introdução das análises de Knuth, a equipa ganhou apenas 6 em 16 jogos, enquanto que na época em que o filme é feito tinha já ganho 11 dos 14 jogos em que tinha participado. Em webofstories.com (a partir do minuto 2:08) pode ouvir-se o próprio Knuth a descrever um pouco desta sua aventura desportiva*.
Mas é só no final da década de 90 que o uso de análises estatísticas no basquetebol começa a ganhar alguma popularidade, através dos websites de Dean Oliver e John Hollinger (ver aqui). Em 2004 Oliver é contratado a tempo inteiro pelos Seattle SuperSonics e pouco depois outras equipas seguem o exemplo, sendo que em 2010 metade das equipas da NBA (as melhores!) tinham pelo menos um especialista em estatística, como é relatado num artigo de artigo de 12 de Março de 2010 no Wall Street Journal, intitulado "Are Statheads the NBA's Secret Weapon?"
Deste lado do Atlântico, em 2007, foi defendida uma tese de mestrado no Departamento de Matemática da Faculdade de Ciências intitulada "Basquetemática: uma incursão da Matemática pelo Basquetebol". Neste trabalho**, que contou com a colaboração da equipa de basquetebol do Futebol Clube do Porto, são usadas cadeias de Markov, uma ferramenta de análise de certos processos estocásticos***, para simular jogos usando informação de jogos anteriores das equipas envolvidas. Estas simulações foram consideradas pelo então treinador do FCP «interessantes para construir cenários» e «ajudar a melhorar a informação a dar ao jogador».
Obviamente, estas intervenções da Matemática no Basquetebol não substituem a experiência, o treino e os conhecimentos dos jogadores e do treinador. Mas poderão ser instrumentos úteis de análise, funcionando como uma espécie de lupa que poderá detectar pequenas debilidades de um jogador ou de uma equipa que são, por assim dizer, invisíveis a olho nu. Por outro lado, é claro que são ainda ferramentas um pouco toscas que necessitam de ser aperfeiçoadas. Mas revelam potenciais muito interessantes e, quem sabe, daqui a uns anos ninguém pense treinar uma equipa sem usar algumas destas ferramentas. Eu não ficaria surpreendido...
* Knuth escreveu também sobre o assunto no seu recente livro "Selected Papers on Fun and Games".
** Um artigo escrito pelo autor da tese sobre o assunto pode ser lido no nº 161 da revista Gazeta de Matemática.
** Para saber mais sobre cadeias de Markov ver o último capítulo do livro "Treze Viagens pelo Mundo da Matemática".